[082] Para além da escola e do associativismo regional (em 1994-95)

Memórias

De 9 a 12 de Novembro de 1994 participei no meu terceiro ProfMAT, desta vez em Leiria.

Nos dois dias anteriores, Segunda e Terça-feiras, animei, com a Patrícia Cascais, a Rita Vieira e a Teresa Nascimento, um Curso sobre «Materiais Manipuláveis no 3º Ciclo». Esta é uma das imagens que guardei dos trabalhos feitos pelos participantes:


No ProfMAT propriamente dito fui responsável por uma Apresentação de Projectos, sobre as «Ludotecas, Clubes e Laboratórios de Matemática» das escolas de Almada e Seixal, e, com o Albano Silva e a Cristina Loureiro, por uma Conferência intitulada, interrogativamente, «Poderá a Formação estar dissociada de um Projecto?». Os três conferenciatas, intervindo no Ginásio da escola que nos acolheu, dispuseram-se assim:


O Albano defendeu as vantagens de os professores se apoiarem a sua «formação contínua» em «projectos».
Eu chamei a atenção para algumas das interacções que surgem a quem organiza o seu trabalho como «projecto»: entre o “envolvimento individual” e o “colectivo”; entre as componentes “acção” e “reflexão” das “intervenções” decididas; entre as “problemáticas internas” e as “externas”; entre a “comunicação escrita”, a “oral” e a “tácita”; entre a “organização formal” e a “não formal”; entre a “restrição” e o “alargamento dos participantes; e entre a “reversibilidade” e a “irreversibilidade das dinâmicas” desencadeadas.
E a Cristina apresentou o projecto do Centro de Formação da A. P. M..

Além do «trabalho», estes encontros também tinham momentos de confraternização, sendo um deles o jantar para o qual todos os participantes costumavam ser convidados. O estilo deste foi «volante», como se nota no prato que cada um dos envolvidos nesta fotografia ostenta em frente ao peito:

Da esquerda para a direita: Pedro Esteves, o outro Esteves (dos Açores),
Zé Paulo Viana, Leonor Cunha Leal, Rita Vieira, Henrique Guimarães e Paula Teixeira

O associativismo era um campo em que os professores podiam intervir directamente, o que já não acontecia ao nível do Ministério da Educação, monde se manteria, durante mais este ano lectivo, a ministra Manuela Ferreira Leite.
Do Ministério da Educação vinha o impulso que generalizava as reformas curriculares (agora chegadas aos 4º, 9º e 11º anos de escolaridade, completando, assim, a extensão da escolaridade obrigatória a todo o 3º Ciclo); mas também era de lá que vinham decisões mais polémicas, como o início da obrigatoriedade de realização de provas globais, para os alunos do 11º ano, e como as alterações ao Regime Jurídico da Formação Contínua de Professores, através do  Decreto-Lei nº 274/94, de 28 de Outubro.
A avaliação dos alunos e a formação dos professores eram duas áreas em que se estavam a fazer experiências de implantação de ideias conservadoras, à boleia das reformas curriculares, o que se compreende facilmente se se olhar para o que foi a sua evolução até hoje.


Comentários

A conferência sobre «formação contínua» teve pouca gente a assistir. Não anotei o conteúdo das intervenções do Albano e da Cristina. E o que eu disse parece-me ter sido baseado na minha experiência recente com os projectos interescolas em Almada e Seixal, portanto ainda muito marcado pelas dúvidas que me ficaram e não tanto por uma convicção clara sobre o que era necessário fazer.
No Centro de Formação da APM defendíamos os «projectos» e a «formação baseada em projectos», mas quase nenhum de nós tinha experiência pessoal sobre as dificuldades práticas desta via. E uma dificuldade adicional tinha a ver com as regras definidas, de cima para baixo, sobre o que deveria ser a «modalidade projecto», uma das opções da «formação contínua creditável». E a ela ainda se juntava outra: poucos seria os professores que se iriam interessar por essa via.

O modo como divulgámos a conferência através do programa enviado previamente a quem se inscreveu no ProfMAT reflectia as dúvidas que os conferencistas tinham no seu íntimo, e certamente uns em relação aos outros (éramos membros da Comissão Pedagógica do Centro de Formação). O que escrevemos começava por cinco “interrogações”:

* A formação é necessária para cada um de nós? Ou todos somos necessários para a formação?
* Que significado pode ter a formação? E ela dispensa a construção de novos significados?
* Se já resolveu o problema de no processo de ensino e aprendizagem o aluno ter um papel activo, como resolve o problema da formação estar centrada em si e nela ter um papel activo?
* Se ainda não o resolveu, pensa que o fulcro dessa resolução passa pela formação?
* Se a formação já era uma realidade na APM, que trouxe de novo o seu Centro de Formação?


Penso que fui eu a escrever esta um pouco estranha (à primeira vista) forma de desafiar os possíveis interessados. Tentando descortinar as origens das interrogações feitas, e seguindo a ordem pela qual elas foram apresentadas:

* Na Assembleia Geral realizada no ProfMat dos Açores (1993) foi levantado o problema da relação entre «formação» dos professores e «financiamento» da APM: qual seria então o principal objectivo da criação do nosso Centro de Formação?
* O António Nóvoa tinha acabado de publicar alguns textos sobre a formação de professores, defendendo neles que a formação contínua dos professores deveria ser a construção de novos significados, ou seja, não ser a transmissão dos significados que os formadores lhe atribuíam. Estaríamos, na APM, a pensar de modo? E os professores?
* A interrogação anterior tem ainda maior relevância por visar proporcionar aos professores melhores condições para que, ao ensinarem, centrassem o seu ensino na actividade dos alunos. Não deveriam, então, os próprios professores ser o centro activo da sua própria formação?
* Nos textos que o António Nóvoa e o Rui Canário escreviam por aquela altura, não se separava a «acção », a «formação», a «investigação», a «organização» e a «mudança». Focar apenas a «formação» não seria um modo de separar o que eles estavam a propor que fosse unificado?
* Estaria portanto o Centro de Formação da APM a inovar numa boa direcção, ou apenas a repetir o que muitos outros Centros de Formação já estavam, mais ou menos conservadoramente, a fazer?

Em 1992-93 eu tinha colaborado na constituição do Centro de Formação da APM. Em 1993-94 e 1994-95 estive-lhe ligado ao prestar algumas horas semanais de trabalho burocrático. Mas as coisas estavam a ir por um caminho em que não havia qualquer clareza de rumo, pelo que em 1995-96 deixei de pertencer à sua Comissão Pedagógica.


Fontes:
Pedro Esteves / Álbum de fotografias analógicas PROFMAT (F112 foto 22) / Envelope com fotografias analógicas (duas fotos do ProfMAT de 1994) / Arquivador de documentos analógicos APM Um (Doc.s 54, 55 e 64)
Livro de Melo (2009; p. 214)

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