Memórias
Apesar de durante este ano lectivo eu ter estado quase sempre «fora da escola»,
devido ao Ano Sabático que tinha solicitado [ver testemunho«093»], regressei sempre
em momentos chave, sobretudo os que relacionados com a Ludoteca e com o Laboratório de
Matemática. A Dona Emília
Ferreira continuava a supervisionar as actividades diárias na
Ludoteca, com o apoio do José Calado e do Manuel Neto (que, na minha
ausência, continuaram a produzir mais exemplares dos jogos e dos
quebra-cabeças), cabendo-me a mim cuidar dos campeonatos. E a Ana Almeida
e a Clorinda
Agostinho coordenavam o Laboratório.
Os Campeonatos
de Jogos de Reflexão disputados este ano foram o 8º de Xadrez, o 5º
de Damas Clássicas, o 5º de Othelo, o 5º de Quatro em linha, o 4º de Abalone e
o 1º de Ouri, não tendo sido estabelecidas, desta vez, distinção de categorias
etárias.
Eis os respectivos resultados:
XADREZ (13 participantes): 1º Áureo Soares (8ºB); 2º Sara Monteiro (7ºA); 3º Olavo Sousa
(8ºB);
DAMAS (8 participantes): 1º José Silvestre (9ºG); 2º João Gonçalves (8ºE); 3º Nuno
Varela (7ºB);
OTHELO (6 participantes): 1º Peter Sousa (10ºB); 2º (ex aequo) Wilson Sousa (7ºC) e João Gonçalves (8ºE);
QUATRO EM LINHA (14 participantes): 1º João Álvaro Cabral (10ºB); 2º Peter Sousa
(10ºB); 3º João
Ricardo (8ºE);
ABALONE (6 participantes): 1º Peter Sousa (10ºB); 2º Nuno Costa (8ºD); 3º (ex aequo) Ricardo Costa (8ºD) e Ricardo Barros
(10ºK);
OURI (7 participantes): 1º Nuno Varela (7ºB); 2º Peter Sousa (10ºB); 3º Wilson Sousa
(7ºC).
No 3º período o Projecto Viva a Escola (coordenado pela Luísa Gracioso) começou a pagar
15 contos mensais a dois alunos de Comunicação da escola para apoiarem a
Ludoteca, com a coordenação da Dona Emília.
O processo de elaboração do Projecto Educativo da Escola (PEE) prosseguiu este
ano. Depois de três reuniões em 1993-94 e de quatro em 1994-95 [ver testemunho
«088»] foram realizadas bastantes mais em 1995-96, tendo, finalmente, deixado
de estar circunscritas à participação dos professores, abrindo-se à restante
comunidade educativa.
Não consegui reconstituir diversos dos passos mais importantes que foram dados,
pois devem ter ocorrido quando eu estive fora da escola.
Segundo as notas que possuo, na reunião de 7 de Setembro os professores que se
reuniram para recomeçar este processo, iniciado dois anos antes, souberam que o
Conselho Pedagógico criara uma «Secção do Projecto Educativo», constituída pela
Antónia
Fradinho, a Aurora Garcia, a Alice Santos, a Lúcia Soares,
a Dulce
Oliveira, a Célia Pereira, a Mª do Céu Vigário e a Adelaide Duarte;
e alguns deles informaram que já tinham concluído uma proposta de inquérito a
dirigir a Alunos, a Encarregados de Educação, a Funcionários e a Professores.
Ainda nessa reunião, o João Louro, que apresentara um documento sobre o
Projecto Educativo ao Conselho Pedagógico, resumiu-nos o que nele escrevera: o
PEE “deve ter à cabeça uma reflexão sobre os órgãos
de gestão”, pois “a Escola deve ser
democrática, com circulação de informações, com revocabilidade das decisões,
com cumprimento do que a maioria determinar”; é “preciso chegar aos alunos”; e a Escola, sendo “um sistema, em que
tudo depende de tudo”, se quiser ser alvo de “mudanças”,
não necessita de “mudar tudo, é sim preciso mudar
coisas essenciais, as quais vão provocar alterações noutras coisas” (estas
citações correspondem às notas que tirei na reunião),
Outra das reuniões em que participei, ocorrida no dia 13 de Março, aconteceu a
pedido de professores da vizinha Escola Básica António Augusto Louro (um desses
professores era o Joaquim Sarmento), com o objectivo de trocar ideias
sobre os respectivos processos de elaboração do PEE. O caminho seguido nesta
outra escola assemelhava-se ao nosso no número de “debates”
a que recorria, mas distinguia-se pelo facto de muitos desses debates serem com
“parceiros externos”. Durante esta conversa
(em que a José Afonso deveria estar a ser encarada como um parceiro externo
pela Augusto Louro) falou-se em virem a ser trocadas ideias entre as “cúpulas” e entre as “bases”
das escolas; e sugeriu-se a criação de um “Forum
para Professores, Pais, Alunos, Funcionários, Autarquias, especialistas”.
Anotei, mais tarde, apenas para mim próprio, que esse Forum poderia ser o ponto
de partida para a elaboração de uma “Carta, ou
Declaração das Escolas”, sobre “princípios
práticos comuns que serão objectivos para todas.” Tal como muitas outras
ideias, estas não passaram daquele momento de boa-vontade mútua durante uma
conversa cheia de esperança.
Os documentos que possuo apontam ainda para um bom número de outras reuniões
sobre o PEE ao longo deste ano, mas só me lembro de ter participado numa delas,
realizada no dia 10 de Abril, sobre as “instalações”
de que a escola precisava (estava-se também no início do processo que viria a
culminar com as «obras na escola») e da qual foi elaborado um relatório específico
para o Conselho Pedagógico.
No entanto possuo diversos documentos, que me foram entregues sempre que
regressava à escola, por uns dias, e que dão uma ideia tanto da exuberância dos
debates como das suas limitações.
Um desses documentos inclui as sínteses das respostas dadas
ao inquérito pelos Encarregados de Educação e pelos Alunos. Tanto a uns como a
outros, de todos os níveis de ensino (isto é, do 7º ao 12º ano), tinham sido
distribuídos 200 inquéritos, sendo recebidas 127 respostas dos primeiros e 195
dos segundos. No entanto, o que eles disseram dificilmente poderia ser
considerado como um apoio para a definição de um Projecto Educativo, talvez
porque quem coordenava a sua elaboração (eu era um deles) tinha uma ideia
ingénua acerca das potencialidades e das dificuldades dos processos de
participação. E o mesmo comentário pode ser feito aos contributos dados pelos
professores: apesar de mais pormenorizados, eles mostram como os temas
abordados se vão afunilando nas pequenas questões do dia-a-dia profissional,
não passando para um nível de conceptualização capaz de as agregar e de as problematizar.
Eleições para o Conselho Directivo
Perto do final do ano lectivo realizaram-se eleições para o ConselhoDirectivo
para o biénio de 1996-98, tendo-se candidatado duas listas.
A Lista A, composta por Joaquina Garcia, Fernanda Pinto, Paula Viegas,
Lucília Pita
e José
Calado, apresentou-se com a bandeira “Uma Escola para Todos, Uma
Escola de Sucesso”.
Eis duas das páginas do seu folheto de candidatura:
E a Lista B, composta por Marília Branco Dias, Adelaide Duarte,
Lúcia Soares,
Luísa
Gracioso e Teresa Morgado, não destacou qualquer
bandeira.
Eis duas das páginas do seu folheto de candidatura:
Foi eleita a Lista B (não registei os resultados numéricos da
eleição).
Comentários:
Olhar para este processo de elaboração do Projecto Educativo (e em particular
quando ele se cruza com a eleição de um Conselho Directivo) levanta-me, hoje,
algumas questões. Começo por estas duas:
Se uma comunidade educativa tem uma dinâmica
cultural mais ou menos estabilizada, por que razões irá redefinir a sua
orientação comum?
Dada a variedade de actores que compõem essa comunidade, e de práticas que
sustentam essa dinâmica, poderá essa redefinição ser feita num período de
apenas dois ou três anos e de um modo estritamente racional?
Ao longo das três décadas que decorreram desde os acontecimentos que relembrei
acima nunca tinha colocado estas questões. E isso sugere-me que volte a olhar
para as bases teóricas, talvez apenas ideológicas, que me tornaram naquela
altura «evidente» o envolvimento na «elaboração de um Projecto Educativo».
Uma dessas bases foi as conclusões do estudo empírico de Berta Macedo que citei
no testemunho «088» e que usei como argumento na minha escola: segundo ela, os
Pojectos Educativos seriam de três tipos: o projecto do «chefe» ou da «equipa», correspondente
ao paradigma racional-burocrático de “organização
eficaz”, no qual os factores como a negociação, a tomada de decisão e a
participação não são considerados elementos fundamentais para a sua riqueza e
realização; o projecto «adição
de projectos dos grupos», correspondente a uma organização escolar
descriptível como “sistema debilmente acoplado”
ou como “anarquia organizada”; e o projecto da «organização escola», correspondente ao
reconhecimento de que “é na riqueza dos actores e
na sua interacção que se joga uma parte fundamental da coerência, pertinência e
qualidade dos projectos”, sendo neste sentido que “elaborar um projecto de escola pode ser entendido como
algo que ultrapassa a questão do domínio de um conjunto de técnicas e
dispositivos sobre metodologias de projecto, para se transformar num processo
de compromisso colectivo sobre a lógica ou lógicas de funcionamento da escola”.
Outra das bases para o meu envolvimento na elaboração do Projecto Educativo
veio do Rui Canário: no início da década de 90 ele defendeu, tal como referi no
testemunho «071», que “Unir, no mesmo processo e
nos mesmos actores, a produção social e a produção de sentido implica instituir
estratégias de inovação baseadas numa metodologia de apropriação que exigem uma
actividade de pesquisa e constituem um processo formativo. É a esta luz, de
fusão num processo único das vertentes da inovação, da formação e da
investigação que, a nosso ver deverá ser reequacionada a questão do processo de
mudança das escolas.” Esta sua convicção agradava-me; e, implicitamente,
propunha como único horizonte de acção o terceiro tipo de Projecto Educativo que
a Berta Macedo identificou empiricamente, o de uma «organização escola»
resultante da «riqueza» e da «interacção» dos seus actores. Este meu agrado sugere-me
que acrescente uma terceira questão às duas que coloquei acima:
Porque razão me agradou esta ideia do
«projecto organização escola»?
Eis a reflexão que faço sobre estas questões:
Na primeira metade dos anos 90 as dinâmicas das culturas escolares estavam,
pelo menos desde há década e meia, a ser alteradas por grupos de professores
que pretendiam mudar o modo tradicional como se aprendia e ensinava. É possível
que na maior parte das escolas essas mudanças já estivessem mais ou menos
estabilizadas. Na minha escola, por exemplo, eu e mais uns tantos professores
fazíamos parte do grupo dos que tinham introduzido essas mudanças, fazendo-o de
um modo não agressivo em relação aos que não as pretendiam introduzir; e,
inversamente, os colegas mais tradicionais não eram agressivos connosco; gerara-se,
assim, um novo equilíbrio na nossa «dinâmica cultural». No entanto, noutras
escolas, como se pode perceber pelo que a Filomena Teles [ver testemunho «068»]
e o José Tomás [ver testemunho «050»] me contaram, essa mudança não fora fácil
e poderia não ter gerado, ainda, um «novo equilíbrio».
Com o início do processo que ficou conhecido por «Reforma de Roberto Carneiro»
todos estes (des)equilíbrios culturais começaram a ser questionados a partir de
fora. O Ministério da Educação apostou, entre outros instrumentos, na
obrigatoriedade de as escolas elaborarem um Projecto Educativo (a Lei de Bases de
1986 já o refere), embora durante pelo menos uma década não tenha querido, ou sido
capaz de, o fiscalizar. A brecha aberta entre as escolas, que redefiniam a sua
«dinâmica cultural», e o Ministério da Educação, que estabelecia uma
«obrigação» sem arriscar a sua «fiscalização», deu azo à «teorização» dos académicos
que desejavam que as escolas construíssem as suas próprias «autonomias»: um exemplo
deste entusiasmo foi o da Escola Cultural, que exigia, para que o seu apoio
fosse prestado, que a escola que a ele se candidatasse já tivesse o seu
Projecto Educativo aprovado [ver testemunho «030»].
Esta mistura de uma subtil pressão externa e de uma visão encantada do futuro
terá sido recebida de modo diferente nas escolas. Na minha, os Conselhos
Directivos nunca tiveram o perfil ou a capacidade para o primeiro tipo de
projecto identificado pela Berta Macedo; por isso, a tentativa iniciada em
1993-94 de elaborar um Projecto Educativo só podia resultar ou na federação das
inciativas que já estavam em curso ou na articulação transformante de todas
essas iniciativas (respectivamente, a «anarquia organizada» e a «organização
escola» da Berta Macedo). O facto de se terem passado três anos lectivos sem
que o processo de elaboração estivesse concluído pode ser um sinal de que havia
uma vontade profunda de «interagir entre todos» e de contar com a «riqueza de
todos», ou seja, um sinal de que se poderia estar a caminhar para um Projecto
Educativo do tipo mais interessante (que é impossível de concretizar se se escolher
um processo de elaboração demasiado curto).
Mas, pelo que fui descrevendo, talvez o processo que estávamos a seguir não se
tivesse afastado suficientemente de uma metodologia racional e de um desejo de
eficácia. Logo em 1993-94, o João Louro percebera que a ideia de um «projecto
de escola» surgira por conveniência do Ministério da Educação, que não nos
queria proporcionar «autonomia» no que respeitava à «organização interna da
escola», às «relações de trabalho», ao «financiamento» e à «possibilidade de
estabelecer protocolos»; no entanto, considerou ele, apesar destes contras
deveríamos aproveitar a «oportunidade»[testemunho «077»]. Depois, em 1995-96, ele
propôs que essa «oportunidade» fosse concretizada (com base na teoria dos
sistemas) através da identificação das «coisas essenciais» que era necessário
mudar na escola de modo que o resto também mudasse; ou seja, não se baseava na
«interacção» nem na «negociação» entre todos, mas sim na identificação (por
quem?) de aspectos chaves que viessem a forçar um «novo equilíbrio» na escola.
A esta subtil corrosão da perspectiva sobre a mudança que se desejava também se
começaram a juntar sinais de que muito do que havia a conversar entre todos
deveria ser, simplesmente, o que já conversávamos no dia-a-dia escolar,
transformando-o, pouco a pouco, em património imaterial de todos. Mas não era
isso que estávamos a fazer.
E isso lembra-me as questões que os animadores do Projecto Educativo da Augusto
Louro queriam abordar em cada “conversa informal”
com os seus «parceiros externos»: “Qual a imagem
actual que tem da escola?”; “O que gostaria
de ver modificado?”; “Quais as expectativas
para cidadãos em formação?”; e “Qual o
contributo que a Escola pode dar para responder a essas expectativas?”
Teriam estas questões proporcionado melhores conversas do que as que estávamos
a ter na José Afonso, ou as dificuldades que encontraríamos teriam sido as mesmas?
Penso que as sucessivas equipas que se candidataram a Conselhos Directivos (e
mais tarde a Conselhos Executivos) na José Afonso (no tempo em que estive nesta
escola) foram muito diferentes umas das outras mas os seus «programas de
candidatura» quase se podiam baralhar e distribuir entre todas ao acaso que cada
um deles ficaria bem com a equipa a que calhasse. O que também aconteceu nos
casos em que surgiram duas equipas a disputar o mesmo mandato.
Isso pode significar que, na José Afonso apenas se desenvolveu uma forma de
pensar sobre o que este órgão de administração e gestão deveria ser (embora as
práticas dos diversos «CDs» tenham sido profundamente diferentes).
Fontes: Pedro Esteves / Documentos
digitais / Tese de Mestrado (ficheiro «4EXPR64») / Arquivador de documentos analógicos
ESJA Seis (doc.s 65, 116, 117, 118, 119, 120, 121, 123, 134, 135 e 139)
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