[095] Projectos ligados à Matemática nas Escolas Básicas de Almada e Seixal (balanço no final de 1995-96)

Memórias

No testemunho «058» fiz este balanço do que sabia sobre os projectos relacionados com a Matemática nas escolas da Margem Sul, em finais de 1991-92.
Mas essa recolha de dados prosseguiu, associada às actividade do Núcleo da APM e, a dada altura, também em função da dissertação da tese de mestrado. Foi, tanto quanto possível, sistemática.
Apresento a seguir o que respiguei acerca das Escolas Básicas.


Escola Preparatória da Amora (actual Escola Básica Pedro Eanes Lobato)

1992-96

A Ana Paula, a Celeste Ganço e a Maria José Marques, depois de criarem uma Ludoteca em 1991-92, na Biblioteca, obtiveram da escola um espaço próprio para as actividades aí realizadas. A escola prestou apoio financeiro, para a compra de jogos, e concedeu às três dinamizadoras (e a outros professores e também a uma Funcionária) tempos para a abertura da Sala e para a preparação e coordenação das actividades aí realizadas, nomeadamente as Semanas do Jogo e os Campeonatos de Escola. No relatório sobre 1994-95 as coordenadoras escreveram que “Sem preocupação de explorar conteúdos científicos, o projecto pretendeu proporcionar, aos alunos, vivências lúdicas que desenvolvessem capacidades e atitudes do domínio afectivo e educasse para a cidadania”.


Escola Preparatória de Corroios (actual Escola Básica de Corroios)

1992-96

Nas actividades do Clube de Jogos Matemáticos, criado por sete professores em 1991-92, os alunos preferiam os “materiais manuseáveis” (quebra-cabeças com fósforos, Tangram) aos passatempos com “o lápis e o papel”. Foi com vase neste clube que foram organizados os “Campeonatos de Jogos de Reflexão”, as “Jornadas da Matemática” e um “Concurso de Problemas Interturmas” e criada uma “Janela da Matemática”, onde se foram mostrando trabalhos dos alunos (como um sobre pavimentações que cruzava a ideia do puzzle com o recorte de fotografias) e prestadas informações, por exemplo sobre as regras do jogo de Xadrez (pois, paralelamente, também foi criado um “Clube de Xadrez”, pelo professor Gastão Cristelo).


Escola Preparatória da Costa da Caparica (actual Escola Básica da Costa da Caparica)

1995-96

A Ludoteca desta escola só foi criada tardiamente, disponibilizando aos alunos diversos jogos de reflexão (Xadrez, Abalone, Quarto, Othelo, etc.).


Escola Preparatória da Cova da Piedade (actual Escola Básica Comandante Conceição e Silva)

1992-96

A Janela da Matemática manteve-se em funcionamento desde 1991-92, animada pela Teresa Nascimento e por vários outros professores. Apoiou um Concurso de Problemas de Matemática, diversos Torneios de Jogos e cursos de iniciação ao Xadrez promovidos pela Câmara Municipal de Almada, com um monitor próprio (os alunos mais interessados no Xadrez puderam também dirigir-se ao Clube Recreativo Piedense, situado nas proximidades, onde, de 2ª feira a Sábado, tinham o apoio do mesmo monitor).


Escola Preparatória do Feijó (actual Escola Básica do Feijó)

1992-96

A Nazaré Antunes animou durante alguns anos um Clube de Matemática nesta escola, que só interrompeu devido à sua participação no projecto da sua escola, o «InforCom», que associava informação e telemática, de que uma parte dizia respeito à Matemática, o InforMat. Esse projecto candidatou-se em 1994-95 ao 7º Concurso do Instituto de Inovação Educacional, tendo a Nazaré, a Helena Mesquita e o Américo sido os seus animadores.


Escola Preparatória de Vale de Milhaços (actual Escola Básica de Vale de Milhaços)

1992-96

Em 1991-92 a Lídia Matias criou um Clube de Matemática, depois designado Núcleo de Matemática e, mais tarde, transformado em Ludoteca. Foi aí que ela começou a animar o concurso “Problemas para Pensar”. Em 1993-94, com a Célia Madeira, face à existência de muito pouco material didático na Escola, estas duas professoras decidem comprá-lo e/ou fabricá-lo; e assim constituíram um conjunto de jogos, de passatempos e de notícias. Em 1995-96 acentuou-se a exploração da vertente lúdica, possível devido à disponibilização de espaço próprio, com funcionamento contínuo, inclusive nos intervalos entre as aulas.

Comentários

Destas seis escolas, três estiveram em contacto com o Projecto MATlab, em 1991-93, e cinco com o Grupo Extracurricular do Projecto INTERMAT, em 1993-94.

Poucas vezes estão explícitas os problemas iniciais que levaram os professores a escolher estas iniciativas (a falta de materiais didácticos na escola é uma das excepções e a falta de as situações que desenvolvam a cidadania é outra), embora, implicitamente, eles estejam quase sempre claros (em particular a desmotivação que muitos alunos demonstram perante a Matemática quando é abordada curricularmente).
Muito mais claras estão as hipóteses iniciais formuladas para responder a esses problemas: no caso da motivação dos alunos, a hipótese foi a de que o seu interesse pela Matemática iria crescer com a abordagem (ou até imersão) desta em contextos extracurriculares (concursos, jogos e quebra-cabeças reflexivos, etc.).
A organização prática destas respostas foi variada e esteve quase sempre explícita: Clube, Janela, Ludoteca, Núcleo.
Já os balanços sucessivos das sucessivas soluções encontradas em cada escola estão pouco claros, o que pode ter sido uma das limitações para o seu sucesso a longo prazo (podendo no entanto o seu desconhecimento por mim resultar das minhas enormes limitações documentais sobre estas iniciativas).


Fontes:
Pedro Esteves / Documentos digitais (tese de mestrado, ficheiro «4EXPR16»);
Testemunho «058» deste blogue. 

[094] O 2º Encontro «Educação e Memórias: Almada e Seixal

Memórias

Realizado no passado dia 29 de Janeiro, de novo na Escola Básica de Vale de Milhaços, este encontro foi constituído por três intervenções.

O Pedro Esteves descreveu o projecto AlterMATivas, através do qual um grupo de professores das Escolas Secundárias Anselmo de Andrade, de Cacilhas, Emídio Navarro, Nº 1 e Nº 2 do Laranjeiro e Nº 1 do Seixal anteciparam, nos anos lectivos de 1990-91, 1991-92 e 1992-93, com os seus alunos, a reforma curricular no 3º Ciclo. E apelidou de «Matemática Experimental» a estratégia pedagógica genérica que esses professores escolheram, como a que está subjacente ao seguinte exemplo:


Por fim, comentou as duas «hipóteses de partida» que tinham sido formuladas, concluindo que a opção por um projecto próprio fora benéfica para o modo como os professores que o implementaram se envolveram nas mudanças que estavam em curso e que a Matemática Experimental, se fora benéfica para as aprendizagens de muitos alunos, mas não o fora para todos, colocando como nova hipótese a necessidade de uma sua mais profunda participação.

O Manuel Lima contou como a construção de canoas na Escola Secundária Moinho de Maré (entretanto desactivada) proporcionou, no início do Verão, descidas do rio Tejo a grupos de alunos e de professores. E contou como, mais tarde, já na Escola Secundária João de Barros, essas descidas se alargaram a outros rios, e como destas iniciativas resultou a fundação de Clubes de Canoagem nas Escolas de Corroios.


Ao descrever uma das descidas que foram melhor documentadas fotograficamente, o Manuel Lima contou ainda como ela proporcionou um contexto favorável a diversas aprendizagens, por alunos e por professores, nos campos das Ciências da Natureza e da Geografia Humana, e, sobretudo, ao desenvolvimento de amizades duradouras.

E a Ângela Mota, a Helena Peixinho e o Manuel João descreveram as múltiplas actividades artísticas iniciadas na Escola Básica António da Costa, que, ao se diversificarem, justificaram a criação da Associação Mundo do Espectáculo, hoje com uma larga história e um presente pleno de intervenções:

Comentários

Como participante (e interveniente) neste encontro gostaria de registar algumas questões que me fizeram pensar, acrescentando-as às que já registei a propósito do 1º Encontro (testemunho «091»):

(1) Estes três testemunhos (diferentemente dos relatados no 1º Encontro) evidenciaram fortes colaborações entre professores, e, em dois deles (os que descreveram projectos mais duradouros), a importância da diversidade dos seus contributos: de que modo o sucesso dos projectos depende deste factor?

(2) Estes três testemunhos referiram-se a projectos que foram pensados para serem interescolas (ou que não hesitaram em o ser quando isso lhes proporcionou um crescimento), e também neste aspecto foram diferentes dos relatados no 1º Encontro: não estarão hoje as iniciativas das escolas (e dos agrupamentos de escolas) limitadas pelo seu encerramento em si próprias?

(3) Não será o associativismo docente imprescindível para que sejam realizados e ampliados os projectos que surgem numa escola (assim o parecem sugerir um dos testemunhos do 1º Encontro e outro do 2º Encontro)?

(4) Que tipo de parcerias ajudam estes projectos a serem concretizados e, sobretudo, a serem ampliados?

(5) A participação dos alunos, desejada (mas diferentemente concretizada) pelos dinamizadores dos seis projectos testemunhados nestes dois encontros, não dependerá daquilo que for definido (mesmo se apenas implicitamente) como «sucesso escolar» (ou como «sucesso educativo»)? E se assim for, não deverá esta definição ser mais amplamente debatida por todos?


Informação: as actas deste Encontro, bem como outros documentos com elas relacionados, estarão em breve acessíveis através do link referido no final do testemunho «091» (onde fiz um breve comentário sobre o «1º Encontro»).


Fontes: Pedro Esteves / Arquivos digitais [pasta «Educação e Memórias: Almada e Seixal» / «2º Encontro (29 de Janeiro de 2025)»]

[093] Um ano lectivo muito diferente (sobretudo para mim): 1995-96

Memórias


As eleições legislativas de 1995 foram ganhas pelo candidato da oposição, António Guterres, o que levou, no dia 28 de Outubro, a uma mudança de ministros da educação: saíu Manuela Ferreira Leite e entrou Eduardo Marçal Grilo (este manteve-se no cargo até 25 Outubro de 1999, quase quatro anos).
Houve um única outra novidade relevante no sistema educativo durante este ano lectivo, a generalização da Reforma Curricular ao 12º ano de escolaridade. Mas, para mim, este ano foi muito diferente do habitual, por razões que nada tiveram a ver com estas mudanças vindas do topo do sistema educativo: com a parte curricular do mestrado concluída, o respectivo projecto de investigação aprovado e um Ano Sabático para o implementar, não tinha turmas para leccionar, embora, cumulativamente ao desafio que assumira, quisesse continuar a dar um apoio na minha (Ludoteca e elaboração do Projecto Educativo) e no Núcleo da APM (Interescolas de Jogos de Reflexão e Encontro Anual de Professores).

Pretendia, com a investigação, compreender a dinâmica cultural gerada pelos professores de Matemática que se tinham envolvido no Núcleo da APM, desde que este fora fundado, em 1989-90. Para isso, precisava de apreciar documentos que haviam registado esta curta história e, para os interpretar, precisava de entrevistar alguns dos colegas que nela tinham estado mais empenhados.
Para as entrevistas escolhi a Filomena Teles, o José Tomás e a Rita Vieira (mais tarde o meu orientador, o José Manuel Matos, quis que eu acrescentasse uma auto-entrevista). Concretizei as três entrevistas em 26 de Setembro e em 16 e 23 de Novembro, usando, como era inevitável naquela altura, um gravador analógico e as respectivas cassetes para as registar magneticamente numa fita:


O gravador analógico e as cassetes com as entrevistas gravadas


A parte mais dura foi a transcrição do som (analógico) para a escrita (digital). Ainda hoje é uma actividade demorada, apesar de tudo ser digital, mas naquela altura era-o ainda mais, pois os dispositivos de controlo do som (pára, arranca; pára, arranca) eram difíceis de manejar. No entanto tinha uma pequena compensação estética: como este trabalho foi feito na Alemanha (onde estava a minha família mais próxima), fi-lo sentado em frente a uma janela onde, frequentemente, podia ver a neve a cair lá fora.

Uma das vantagens de ser o entrevistador a fazer a transcrição (há quem a encomende) é passar mais tempo com os entrevistados. Não é só ouvi-los de novo, é também escrever o que ouve, tendo portanto mais tempo para ir pensando no que ouviu e assim reforçando a empatia com quem falou. Este maior envolvimento levava a que, ao fim de algumas manhãs, quando saía de casa para ir almoçar, ainda estava a «falar» ou com a Filomena, ou com o Zé, ou com a Rita, até me dar conta de que, à «nossa volta», estava a nevar.

Já usei parte destas três entrevistas quando fiz o balanço do projecto AlterMATivas [testemunhos «069» a «073»]. E nelas também abordei os outros dois projectos interescolas que o Núcleo da APM lançara, o MATlab e o InterMAT; além, claro, da vida associativa que os tornou todos estes projectos possíveis.
Vou voltar a essas entrevistas, seleccionando desta vez o que nelas há de «balanço» do que fizéramos e, por vezes, de «sonho» em relação ao futuro. Estávamos, por volta desse ano lectivo, num momento de «transição», que nada tinha a ver com a mudança de ministros, e que estava muito para além daquilo que nos era de imediato perceptível. Na altura não o percebi, mas hoje essa «transição» já se me tornou muito mais clara.

Para a Rita Vieira, saber que existiam materiais didáticos, como o geoplano, que se podiam usar na aprendizagem da Matemática, não tinha sido suficiente para que ela se decidisse levá-los para as suas aulas. Foi sobretudo com o projecto AlterMATivas que ela deu “o grande salto”: se “já sabia” que era importante os alunos usarem “alguns materiais”, “trabalharem em grupo”, “tirarem conclusões”, “fazer conjecturas”, também sabendo que havia quem o fizesse, sem que “nunca” o tivesse “visto”, foi com os colegas do Núcleo com quem viria a trabalhar no AlterMATivas que ela sentiu ter um “apoio de rectaguarda”, um grupo onde poderia “discutir aquilo”.
Já antes do AlterMATivas, na altura em que foi fundado o Núcleo da APM, com colegas que ela não conhecia (à excepção da Ângela e da Filomena), se tinha gerado um ambiente do tipo «E se a gente fizesse, e se a gente fizesse?», ela sentira ter-lhe aparecido um grupo onde teria a coragem para dar “o grande salto”.
As vantagens de trabalhar em grupo também existiram no projecto MATlab, embora aí as oportunidades fossem menos intensas, pois os produtos finais não as exigiam tanto, dado se tratar de um projecto extracurricular. Foram portanto estes projectos, e o Núcleo, que “vieram resolver um problema, que foi o trabalho em grupo”. E isso foi importante para ela porque não tinha tido situações dessas na escola, a não ser muito pontualmente.

No entanto a Rita ficou com uma dúvida fundamental acerca do relacionamento que tinha com os alunos, conforme trabalhava com eles nas aulas, ou fora das aulas: “Eu gostava de perceber o que é que se passa dentro de uma aula que faz com que duas pessoas, as mesmas, mudem de espaço e tenham uma atitude completamente diferente, não só em relação um ao outro mas em relação ao próprio trabalho”, desabafou. No ano anterior ela tinha estado “com não sei quantos miúdos a construir sólidos” geométricos para uma exposição que os professores estagiários de Física e Química da sua escola fizeram em Almada; “eles estiveram ali [sempre com grande “alegria”] a fazer aquilo, a contar os quadrados que eram precisos, a contar quantas faces, e depois como é que é os vértices, e depois como é que [tudo se une].” Então, “o que é que se passa? o que é que muda?” entre a aula e o fora da aula?

Mas, continuou ela, naquela altura os projectos associados ao Núcleo também estavam a ter problemas, pois nem estavam activos, nem os seus materiais estavam a ser utilizados. E deu uma pista para isso: “Se não tivesse havido Reforma [Curricular] a gente tinha continuado a trabalhar”; os novos manuais escolares até tinham sido elaborados por colegas com quem nós concordávamos “mais ou menos”, pelo que teremos sentido que não precisávamos de fazer os nossos materiais, e o AlterMATivas “esvaziou-se aí”.
Quanto ao MATlab, que não desapareceu logo, se se verificou um aumento do número de participantes, a sua intensidade de trabalho passou a ser mais reduzida, apesar de haver imensas ideias por explorar.

O que se estava a passar com os projectos, comentou a Rita, também tinha a ver com o Núcleo. Ela chamou a atenção para haver professores que tinham deixado de aparecer, talvez para tratarem das “suas coisinhas” nas respectivas escolas, ou para evitarem assumir responsabilidades na coordenação do Núcleo (nós defendíamos que esta devia ser rotativa). E também reparou que havia professores que intervinham nos encontros anuais organizados pela APM mas não nos do Núcleo. E isso trazia o “perigo” de os encontros regionais serem transformados “em ir lá alguém [de fora] a debitar” e nós [os de dentro] apenas a “receber”.
“O que me apetecia propor” concluiu a Rita, era “fazer um levantamento exaustivo do que as pessoas estão a fazer, mas as pessoas podem não estar para isso, não é”, podem não querer que aquilo que fazem seja “como um trabalho integrado no Núcleo”; e, nesse caso, “o Núcleo não serve para nada e então acaba-se com ele”, pois além do encontro regional de professores “começa a não servir para nada”.

O José Tomás não se tinha envolvido tanto no Núcleo e nos seus projectos interescolas, preferindo investir na mobilização dos colegas da sua escola. Por isso, nesta entrevista, queixou-se exclusivamente das dificuldades que aí encontrara.
Depois de defender o “direito ao projecto” e de chamar a atenção para que a possibilidade de realizar projectos nas escolas não estava a ser respeitada, por não lhes serem proporcionadas as adequadas “condições”, considerou que aquilo a que se chama “cultura de escola” é a “cultura do funcionalismo” do Estado (uma “entidade que ninguém percebe quem é”). Era a primeira vez que ele estava tanto tempo na mesma escola, pelo que só agora se apercebia das “profundas relações que se estabelecem [nelas]”, ou seja, “aquilo que a gente quer dizer quando fala na cultura de escola”, e que “não vai mudar nos próximos séculos”. Para ele, as escolas eram “instituições anti-projecto”, porque os professores têm nela um grande poder, exercido através da avaliação dos alunos, e porque a maioria dos Conselhos Directivos procura controlá-la em seu benefício. O que existia de interessante nas escolas eram as “bolsas de resistência”, sendo a partir delas que podia haver alguma frontalidade em relação a esse duplo poder. A “condição de profissional da educação”, concluiu o Zé, deveria equivaler a estar “na escola de corpo inteiro”, nas aulas e fora delas; para se implementar um projecto não é possível fazê-lo sózinho, pois há constantes exigências para o “reflectir”, para o “reformular”, para o “reapreciar”.

Por isso, na altura em que foi entrevistado, aquilo que o Zé gostava de fazer “era ir experimentar outras coisas", pois na escola não via “condições de mudança”. Talvez iniciar um “projecto novo”, como “uma cooperativa ou coisa do género”. Mas, interrogou-se, receava que “o sistema” acabasse por fechar essa via, pois os miúdos, “mais tarde ou mais cedo”, terão de entrar nele, terão de “fazer exames e provas pedagógicas, e exames profissionais”, problema que já havia sido colocado pelo Movimento da Escola Moderna: aí os miúdos têm “direito à palavra”, a “questionar o professor”, a “questionar o poder do professor” e o seu “poder de saber”; mas mais tarde esses alunos iam “com a mesma postura” para a escola oficial e eram “cilindrados pelo sistema”, eram “considerados irreverentes, mal-educados”.

O que atraíu inicialmente a Filomena Teles na escola foi a possibilidade de aí fazer “trabalho extra-curricular”, tendo a “profissionalização em exercício” sido uma primeira oportunidade para isso. E a Escola Cultural foi uma outra, dando “mais importância à formação integral do aluno” e exigindo que as actividades escolhidas fizessem “parte do Plano de Escola, com objectivos, com estratégias de trabalho, com uma série de preocupações que ligavam o que se passava nos clubes aos objectivos gerais dos currículos”; mas quando os professores que não estavam interessados em “mudar” notaram que os alunos aderiam a esse tipo de actividades, desencadearam-se os “conflitos”.
Por isso, a certa altura, a Filomena procurou realizar actividades semelhantes às extracurriculares nas suas aulas, onde não teria de enfrentar conflitos provocados por outros professores. E mais tarde interessou-se pelo trabalho com os seus colegas do Núcleo da APM no AlterMATivas e no MATlab, pois aí se poderiam realizar “actividades que não estavam directamente ligadas aos objectivos do programa”.

No entanto, desabafou a Filomena, todas estas actividades dependiam do ambiente da escola, e esta cada vez dizia menos aos alunos: até ao início do 3º Ciclo a escola ainda lhes dizia qualquer coisa, a partir daí a “sociedade”, através dos “valores” que a “comunicação social” transmitia, tinha “mais força”, e a “cultura da escola” não a conseguia contrariar, porque leva muito tempo a mudar (não adiantando tentar mudá-la “por decreto”); alguns anos antes ainda havia uma abertura à mudança mas, naquela altura, o “retrocesso” era enorme, com cada vez mais “problemas sociais”, pedindo-se à escola que os combatasse “com armas que não [têm] a mesma força” que a da televisão.

Por isso, desejou a Filomena, teria “piada” que o grupo do AlterMATivas e do MATlab, tal “como ele está, com as experiências enriquecidas que tem, fosse trabalhar todo para uma escola”, por exemplo uma “escola integrada”, onde pudesse fazer uma experiência” de desenvolvimento dos alunos, “não só na Matemática”, também com psicólogos e sociólogos, com a sociedade “mais dentro da escola” e com a escola “mais cá fora”, de modo a que “as próprias famílias se fossem modificando e tivessem um papel”, como talvez já acontecesse na Escola Primária.


Comentários

Estes três testemunhos tiveram dois aspectos fortemente em comum: por um lado, olharam de um modo muito crítico para as escolas e, um pouco, para o Núcleo da APM; por outro, preocuparam-se menos com os condicionamentos externos do que com a procura de uma continuação para o trabalho conjunto que até aí tínhamos feito.

A Rita não encontrara na sua escola gente com quem trabalhar em grupo. A Filomena deparara, nas escolas que conhecera, com muitos professores que estavam contra as «mudanças». E o Zé, em vez de colegas com uma atitude profissional «de corpo inteiro», encontrara nas escolas por onde passara muitos «funcionários do Estado», que usavam a avaliação dos alunos (ou os cargos directivos) como fonte de poder, deduzindo daí que as escolas seriam «instituições anti-projecto», apenas confrontáveis por algumas «bolsas de resistência».
Por isso a Filomena, considerou que os projectos em que se envolvera com colegas do Núcleo da APM tinham sido uma solução para as dificuldades que encontrara; mas, para a Rita, também estavam a surgir sinais preocupantes no Núcleo, pois muitos dos professores que aí se tinham inicialmente envolvido estavam a desviar a sua atenção para outras prioridades.
Segundo a Rita, uma explicação para a redução do interesse em trabalhar no Núcleo poderia estar na Reforma Curricular que se estava a generalizar, quer pelos desafios que a sua implementação na escola colocava, quer porque esses colegas preferiam o apoio que os novos manuais escolares lhes trouxeram.

A negatividade do «balanço» feito pela Rita, pelo Zé e pela Filomena encontrou um eco só parcialmente esperançoso quando eles formularam o que desejavam para o «futuro».
A Filomena gostaria que o grupo com que trabalhara nos projectos, em vez de estar disperso por várias escolas, se transferisse para uma mesma escola, onde dispusesse de condições institucionalizadas para fazer um trabalho com maiores hipóteses de sucesso; mas, receou ela, ainda seria necessário enfrentar a influência crescente que a «sociedade», via «meios de informação», exercia sobre os alunos.
O Zé imaginou uma «cooperativa» onde pudesse concretizar «projectos» (para o que seria necessário reunir um grupo com as mesmas intenções); e, tal como a Filomena, receou o que aconteceria aos alunos quando fossem envolvidos no choque entre esse isolamento e a realidade exterior.
E a Rita, mais próxima da realidade em que estávamos, apenas gostaria de fazer um «levantamento» do que estava a ser dispersamente feito, para poder imaginar que ligações estabelecer entre todas as iniciativas que estavam em curso, admitindo, no entanto, que os colegas poderiam não estar interessados nisso.

Sentíamo-nos isolados, procurávamos uma solução para a nossa vontade de intervir e de cooperar, mas estávamos bastante cépticos.

Já não me recordo claramente do que eu próprio sentia nessa altura. Mas como tinha decidido entrar no mestrado [testemunho «090»], a minha escolha terá sido «aprender mais» e, ao investigar com novos conhecimentos, «compreender melhor» o que me rodeava. E só depois decidiria o que fazer, mantendo entretanto contacto com a minha escola e com o Núcleo.

Mas havia muitas coisas que estavam a mexer nesses anos de transição para a segunda metade da década de 90, algumas delas já identificadas, retrospectivamente, nos testemunhos anteriores:

* Acabava de ser decidido que o próximo Encontro Nacional de Professores de Matemática (ProfMAT), organizado pela APM, se iria realizar, no final de 1996, em Almada; mas essa decisão fora tomada sem consultar os sócios do Núcleo da APM em Almada e Seixal, embora dependesse inevitavelmente do apoio de muitos deles, pelo que teria consequências no trabalho aqui realizado; foi um sinal de que o associativismo a nível nacional começava a impor interesses que podiam não coincidir com o associativismo regional;

* O início da Reforma Curricular absorvia muitas atenções dos professores que a implementavam; foi o caso da Área Escola, que mobilizou alguns grupos de professores mas que também gerou fortes indiferenças, ou até alguma resistência, por parte doutros [testemunho «086»];

* Uma minoria dos professores não se sentia confortável com a Reforma Curricular que estava a ser generalizada, sentindo-a já como tendo falhado; se eles procuravam manter a sua «autonomia» (iniciativas curriculares próprias; formação contínua independente), a maioria dos seus colegas hesitava acerca dos exemplos em que se deveria inspirar, se nos do Ministério da Educação, se nos do Ensino Superior, se nos dos seus colegas mais «autónomos» [testemunho «090»];

* À medida que a generalização da Reforma Curricular foi sendo feita, alguns professores do ensino superior começaram a pretender «ensinar os professores do ensino não superior» (e não apenas os futuros professores) [testemunho «090»]; paralelamente, começaram a surgir medidas que tornavam a formação académica hierarquicamente mais importante que os outros tipos de formação [testemunho «092»];

* As escolas estavam a ser gradualmente envolvidas na elaboração de um Projecto Educativo próprio; o poder de um tal instrumento, ao desencadear os interesses de quem o queria usar a seu favor, obrigou todos os outros actores a esforços mais intensos e apressados para o transformar em ferramenta comum [testemunho «088»];

* Alguns parceiros das escolas começaram a propor-lhes «grandes iniciativas» destinadas à sua «participação», o que alienou as alienou do controlo sobre as iniciativas em que se envolviam; a «naturalização» destas «parcerias», a vontade que alguns desses parceiros tinham em hegemonizar certas áreas da educação e a fraca vontade de autonomia da maioria dos professores, impediu que este problema fosse atempadamente identificado [testemunho «087»];

Havia, pois, uma profunda mas silenciosa mudança em curso, e todos nós estaríamos com bastante dificuldade para a apreender e indecisos acerca do que deveríamos (e poderíamos) fazer.



Fontes:
Wikipédia (para os ministros da Educação)
Pedro Esteves / Arquivadores digitais «Tese de Mestrado» (Doc.s: 4EXPR11, 4EXPR12, 4EXPR13, 7ANEX3, 7ANEX4 e 7ANEX6)

[092] O fim de um ciclo no Centro de Formação da APM

Memórias


O Centro de Formação da Associação de Professores de Matemática (CF da APM) foi criado em 1993, tendo adoptado como a filosofia da «formação baseada em projectos» [ver testemunho «082»].

A formação contínua dos professores tinha acabado de ser tornada obrigatória, estando portanto entre as principais preocupações do associativismo docente. Um exemplo dessa preocupação foi a realização do Seminário sobre Formação de Professores, organizado pelo Secretariado Inter-Associação de Professores (SIAP), que decorreu no Externato Marista de Lisboa, em 28 e 29 de Janeiro de 1994, e no qual participaram nove das associações que integravam o SIAP.

Pouco depois, também o CF da APM organizou um Seminário, destinado aos projectos de professores de Matemática que se quisessem nele inscrever, designando-o por Projectos e Formação: Acção, Reflexão e Matemática. Decorreu ao longo de 8 sessões, de Abril a Outubro desse ano, e incluiu várias intervenções vindas do mundo dos investigadores, sobre «formação centrada na escola», sobre «concepções dos professores» (quer acerca do ensino, quer acerca da profissão), sobre «saberes dos professores», sobre «projectos e formação» e sobre «didáctica e formação». E destinou duas das sessões à audição da voz dos próprios projectos.

Participaram neste Seminário professores ligados a seis projectos, assim caracterizáveis:
* Geometria – do concreto ao abstracto, da indução à abstração, envolvendo 31 professores de 16 escolas da região de Leiria (leccionando desde o 1º Ciclo ao Secundário), organizados em 5 grupos, cada qual com um orientador;
* Métodos Quantitativos – programa para o ensino artístico, envolvendo os 5 professores de 5 turmas do 10º ano da Escola Secundária António Arroio, em Lisboa, organizados como grupo único, com uma orientadora;
* G. E. M. – gráficas no ensino da matemática, envolvendo 4 professores de 4 escolas da região de Lisboa (leccionando 7 turmas do 10º e do 11º anos), organizados como grupo único, com uma orientadora;
* História e Ensino da Matemática, envolvendo 7 professores de 7 escolas da região de Lisboa (leccionando 5 turmas do 3º Ciclo e 2 do 10º ano), organizados como grupo único, com uma orientadora;
* Oficinas de Matemática, envolvendo 3 professores da Escola Conde de Oeiras (leccionando o 3º Ciclo), organizados como grupo único, com uma orientadora;
* INTERMAT, envolvendo 27 professores de 13 escolas dos concelhos de Almada, Cascais e Seixal (leccionando desde o 2º Ciclo ao Secundário), organizados em 3 grupos, auto-organizados.

Resumindo estes números, estavam representados neste Seminário 77 professores (que leccionavam em 42 escolas das vizinhanças de Leiria e de Lisboa), mais 9 orientadores.
Através das notas tiradas aos debates ocorridos durante estas duas sessões, consegui identificar os seguintes professores que nele participaram: Adelina Precatado; Albano Silva; Alcides; Ana Vieira Lopes; António (Leiria); Cristina Loureira; Elvira (Leiria); Filomena Teles; Graciosa Veloso; Josefa; Isabel Paulo; Manuela Pires; Margarida, Mª José Oliveira; Paula Teixeira; Paulo Abrantes; Pedro Esteves; Rita Bastos; e Rita Vieira.

Eis como o decorrer deste Seminário foi descrito, em Junho de 1994, no boletim informativo da nossa associação:



Comentários

Na primeira das sessões destinada a «ouvir a voz dos participante» (realizada no dia 4 de Maio) as intervenções centraram-se em cada projecto, pelo que não foram abordadas questões gerais. Mas na segunda das sessões (no dia 22 de Outubro), dado pretendermos apreciar o trabalho que fizéramos, essas questões puderam vir ao de cima.
O que para mim foi mais interessante, olhando agora para o que então foi dito, disse respeito ao futuro que desejámos para a formação contínua na nossa associação: alguns dos professores envolvidos nos seis projectos defenderam, claramente, que se deveria continuar a apostar na «modalidade projecto», ou seja, na formação que resultasse das intenções de intervenção na escolas; mas duas ou três vozes consideraram que esta modalidade era «elitista», pelo que defenderam a reconsideração da estratégia até aí seguida pelo Centro de Formação da APM.

Porque terão alguns sócios da APM afirmado que a «formação baseada em projectos» era «elitista»?
Eles pretenderiam certamente dizer que um «projecto» não estava ao alcance de qualquer professor, ou seja, que poucos seriam capazes de o elaborar e de o concretizar, e que portanto não seria um bom contexto para a sua «formação».
Só que, ao dizê-lo, esqueciam o facto de, desde há quinze anos, um enorme volume de «formação inicial» ter sido realizado como Profissionalização em Exercício, cujo eixo era a elaboração e a implementação (durante dois anos) daquilo a que se chamava Plano Individual de Trabalho (PIT). Ou seja, o Ministério da Educação considerou que qualquer professor, mesmo sem experiência profissional, era capaz de elaborar e de implementar um projecto (o PIT era, de facto, um «projecto»), e muitos professores cuja formação inicial seguiu essa via (eu fui um deles) consideram, hoje, que essa foi a melhor modalidade de sempre para a concretizar.

Então, porquê, em 1994, alguns professores terem considerado que um projecto não estava ao alcance de qualquer um?
A explicação para esta estranha opinião estava em que o Ministério da Educação se tinha tornado mais conservador, e isso reflectia-se no modo como estabeleceu as regras para as diferentes modalidades de formação contínua: a modalidade de «projecto» fora definida, de facto, como inacessível para a grande maioria dos professores, a não ser que fossem acompanhados por um “orientador” e “avaliador” que tivesse, pelo menos, a qualificação mínima de “mestre”!
Portanto, os «projectos» não eram «elitistas»: as regras que foram impostas à «modalidade de projecto» é que o eram, nomeadamente estabelecendo uma hierarquia que conferia especial poder à formação académica. Se o Centro de Formação e a própria APM não fossem capazes de enfrentar criticamente esta imposição, os professores iriam ficar dela prisioneiros.

Para a formação contínua na APM, o ano lectivo de 1994-95 começou com este Seminário. E durante o resto dete ano o Centro de Formação não tomou uma posição clara sobre se iria continuar ou se iria mudar a estratégia formativa que tinha adoptado desde que fora criado. Eu fazia parte da coordenação do Centro de Formação e fui gradualmente sentindo que os meus colegas deixavam de ter força para defender a formação contínua baseada nos envolvimentos dos professores e estavam a começar a defendê-la com base em conceitos provenientes de teorias académicas conservadoras, pelo que decidi retirar-me desta colaboração com a APM.

Alguns meses mais tarde, em Janeiro de 1996, a Direcção da APM anunciou que o “ciclo” da formação contínua baseada em projectos terminara e que seria necessário iniciar um novo “ciclo”.


Fontes: Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos APM Três (Doc.s 23, 24, 27, 31, 32, 42, 43, 45, 46 e 47)

[091] O 1º Encontro «Educação e Memórias: Almada e Seixal

Memórias


Há cerca de dez anos um grupo de professores e outros educadores iniciaram o esboço de um projecto de recolha das memórias ligadas à educação nos concelhos de Almada e Seixal. Inicialmente chegaram a reunir-se duas dezenas de interessados, mas, pouco a pouco, o grupo foi-se reduzindo, destacando-se entre os resistentes o Antão Vinagre, o Carlos Abreu, o Joaquim Guerreiro e o Pedro Esteves.
Em 2016 o projecto foi interrompido, tendo sido retomado no final de 2024.

Em vez de um grande encontro» optou-se agora por organizar vários «pequenos encontros», cada qual com a duração máxima de um dia, de modo a que no espaço «entre-encontros» pudéssemos ir mobilizando mais testemunhantes e garantir-lhes tempo para preparar os respectivos testemunhos.

O 1º destes encontros foi realizado no passado dia 14 de Novembro, na Escola Básica de Vale de Milhaços, tendo sido constituído por três intervenções, seguidas de debate e acrescentadas com uma conversa final. As actas, bem como outros documentos relacionados com este encontro, estão acessíveis através do link referido no final desta mensagem.

O Manuel Lima contou como, ao longo de vários anos, na Escola Secundária João de Barros, com os seus alunos, foi «salvando pedras» que contavam partes da história do concelho do Seixal:


O Joaquim Guerreiro testemunhou o modo como experimentou, na Escola Básica António Augusto Louro, a metodologia do Movimento de Escola Moderna (MEM) com as suas turmas:


E a Lídia Matias descreveu o que fez para, ao longo de mais de trinta anos, ir mantendo e melhorando a Ludoteca da Escola Básica de Vale de Milhaços:


O 2º Encontro «Educação e Memórias: Almada e Seixal» será realizado no dia 29 de Janeiro, na mesma escola.


Comentários

Como participante neste encontro, gostaria de destacar cinco das questões em que ele me fez pensar:

(1) a dada altura o Manuel Lima lembrou que a preocupação em salvaguardar vestígios materiais do património local havia sido aprendida no Ecomuseu Municipal do Seixal, onde ele já trabalhara - não deveriam os professores envolver-se em muitas experiências exteriores às escolas de modo a terem uma compreensão mais vasta das potencialidades educativas que se lhes deparam?
(2) o Joaquim Guerreiro, quando decidiu inspirar-se na metodologia do MEM, alterou radicalmente a sua forma de ensinar – não terão os professores falta de contactos associativos frequentes, capazes de lhes trazerem inspirações transformadoras?
(3) a Lídia Matias iniciou a Ludoteca da sua escola com o apoio do associativismo, mas depois fez um longo percurso sem dispor de quaisquer apoios – não mereceriam as experiências de longa duração de uns professores ser aproveitadas por outros?
(4) estas três histórias tiveram, sem excepção, uma forte (ou até exclusiva) componente extracurricular, o que agradou bastante aos participantes nos respectivos debates – não andaremos a deixar-nos fechar demasiado nas prescrições curriculares?
(5) enquanto professor fui múltiplas vezes abordado para ajudar a encontrar colegas que respondessem a inquéritos destinados a teses de mestrado, mas nunca os resultados dessas teses chegaram à minha escola – não deverão ser os professores (ou outros profissionais) a recolher, a debater e a organizar as suas próprias memórias?


Fontes
: arquivos digitais de Pedro Esteves, pasta «Educação e Memórias: Almada e Seixal», ficheiro 1º Encontro (e) Actas


Link para download da documentação relacionada com o 1º encontro: https://www.dropbox.com/scl/fo/62a158ffpjbinmq5eu0yz/AOqzXqnvT3n8qkEyiRiRAk0?rlkey=fq90xev8duxtek4q28qikxo9n&st=h1d712nw&dl=0

[090] O 5º Encontro Regional de Professores de Matemática

Memórias

Para o Núcleo Regional da APM, 1994-95 foi um ano discreto.
Segundo os meus documentos, foram prosseguidas apenas três das linhas de trabalho iniciadas em anos anteriores: o Grupo de Trabalho Extracurricular; o Interescolas de Jogos de Reflexão [ver o testemunho anterior]; e o Encontro Regional de Professores de Matemática.

Este ano, o Grupo de Trabalho Extracurricular envolveu docentes de 12 escolas dos concelhos de Almada e Seixal, voltando a adoptar a designação «MATlab». As reuniões foram sempre na Emídio Navarro (em 13 de Setembro, 26 de Novembro, 21 de Janeiro, 18 de Fevereiro, 25 de Março e 27 de Maio), sendo dedicadas a ampliar os temas abordados nos anos anteriores e a proceder ao respectivo aprofundamento teórico. Procurou-se alargar o número de professores envolvidos nas pesquisas e na coordenação e visou-se mais consistentemente estabelecer ligações entre os temas não curriculares e os temas currículos.
Foi um trabalho de auto-formação, e nenhum dos professores se preocupou com a sua «creditação», contrariamente ao que começava a ser uma obsessão para outros, após a imposição da obrigatoriedade a que a formação contínua fora sujeita.

A realização do 3º Interescolas de Jogos de Reflexão, organizado pelo Grupo de Trabalho [ver o testemunho anterior], mostrou que esta iniciativa estava a entrar na maturidade.

E a realização do 5º Encontro Regional de Professores de Matemática, nos dias 12, 13 e 14 de Julho, na Escola Preparatória de Corroios, mostrou que as iniciativas do Núcleo já eram maduras no que respeita aos docentes: ele juntou 90 professores de todos os graus de ensino, vindos de 31 escolas, tendo-se 15 desses professores responsabilizado pelas intervenções.

Nos encontros anteriores, o total dos professores participantes vindos de Escolas Básicas havia oscilado entre 5 e 9 (de apenas 3 a 5 escolas), tendo desta vez sido 33 professores (de 15 escolas). O número de Escolas Secundárias oscilou pouco ao longo destes encontros (entre 12 e 16, variando os respectivos professores entre 39 e 53). E o número de responsáveis pelas intervenções, apenas foi claramente superior no 1º Encontro Regional (21), tendo-se estabilizado nos seguintes (entre 12 e 16):

Houve uma razão para o excepcional número de professores do Ensino Básico que participaram neste encontro: a Ana Boavida, um dos membros da Comissão Coordenadora do Núcleo e, portanto, também organizadora do Encontro Regional, leccionava no Ensino Superior, pelo que tinha uma grande ligação aos professores que leccionavam no 1º Ciclo, pelo que terá mobilizado a sua participação.
Contrariamente aos encontros anteriores, não houve intervenções de professores envolvidos em novos projectos nas escolas, mas sim reflexões sobre o que se experimentara e aprendera em anos anteriores (2 sessões práticas); e aumentaram as intervenções baseadas na teoria (4 sessões práticas, maioritariamente orientadas por professores do ensino superior).
Uma das sessões práticas relacionadas com projectos foi orientada pela Ana Mota, pela Rita Vieira e por mim, resultado do que aprenderamos ao longo do ano no MATlab (designamo-la por “Explorações Matemáticas: Teorema de Pitágoras & Teorema das Quatro Cores”).
Além destas 6 sessões prática houve duas outras intervenções. Uma delas foi bastante estranha: o José Manuel Matos, que em encontros anteriores realizara interessantes intervenções com a Ana Boavida, decidiu desta vez apresentar, sozinho, uma descrição pormenorizada da «Educação Matemática», o novo campo de investigação que se estava a constituir em Portugal (e que noutros países já se tinha constituído há muito); talvez a sua ideia fosse promover o interesse de professores do Ensino Não Superior a inscreverem-se nos mestrados relacionados com este campo, em particular na Universidade Nova de Lisboa (eu e a Filomena Teles estávamos lá [ver testemunho «073»], tendo-o como nosso potencial orientador da tese); só que ele se esqueceu que a Educação Matemática não é só um «campo de investigação», mas sim a prática de qualquer professor envolvido no «ensino» da Matemática, e esse esquecimento pode ter ajudado a cavar um fosso entre estas duas formas de acção (os investigadores estavam a fechar-se na sua própria acção).
A outra intervenção foi uma mesa redonda dedicada a apreciar a reforma curricular cuja generalização estava em vias de ser concluída. Intitulada “Ensino da Matemática: Reflexões sobre o fim de um Ciclo”, foi moderada por mim e teve como convidados o Fernando Camejo, o Gastão Cristelo e a Patrícia Cascais, que comentaram uma série de questões que, previamente, foram solicitadas a quem as quisesse colocar. A introdução, tal como foi depois publicada nas actas do encontro, foi esta:



As questões chegadas à mesa, para serem comentadas pelos três convidados, foram divididas em três grupos. Parece-me interessante reler o que então se questionou e comentou, dado ser uma forma de conhecer as dinâmicas resultantes das reformas curriculares lançadas «de cima para baixo».

O primeiro grupo dizia respeito à gestão dos novos programas pelos professores e incluiu as seguintes questões:


Os comentários que os três convidados fizeram a estas questões foram estes:


O segundo grupo de questões incluía as referentes aos resultados do processo educativo durante esta reforma curricular:


Eis os comentários feitos:


E o terceiro grupo questionava o papel dos professores no processo da reforma curricular:


E a estas questões foram feitos estes comentários:


No último dia deste encontro ainda houve tempo para um «passeio mistério» ao Moinho de Maré, situado bem próximo da escola onde estávamos, o que também constituiu uma forma de conhecermos um recurso patrimonial que, muitos anos mais tarde, viríamos a explorar sob o ponto de vista da Matemática e de outras disciplinas curriculares.

Comentários (a todo este testemunho)

Aos sinais de «mudança» que identifiquei na José Afonso [ver testemunhos «087» e «088»] não seriam alheios outros sinais de mudança de que me estava a aperceber no associativismo e, em geral, no sistema educativo. Este 5º Encontro Regional fundamenta bastante bem essa minha impressão, sendo identificáveis nele, como factores desequilibrantes, a «reforma curricular» e as pressões aos níveis da «formação contínua» e da «organização das escolas».

Como consequência, este conjunto de condições estava a estabelecer diversas divisões: os professores do ensino superior começavam a pensar que também deveriam «ensinar os professores do ensino não superior» (e não apenas os futuros professores); e os professores do ensino não superior começavam a dividir-se, uma minoria procurando manter a sua «autonomia» (iniciativas curriculares próprias; formação contínua independente) e a maioria hesitando acerca dos exemplos em que se deveria inspirar (os do Ministério da Educação, os do Ensino Superior, os dos seus colegas mais «autónomos»).

Para além destas divisões, era sobretudo claro que muitos professores não se sentiam confortáveis com a reforma curricular. E que esta, que ainda não terminara a sua generalização, já era sentida como tendo falhado.


Fontes: Pedro Esteves / Arquivadores de documentos analógicos ESJA Seis (Doc. 65) e Núcleo APM Um (Doc.s 54 e 55) / Actas do 5º Encontro Regional

[089] O 3º Interescolas de Jogos de Reflexão de Almada e Seixal

Memórias

Depois de ter sido realizado na Escola Secundária António Gedeão e na Escola Básica de Corroios, o interescolas de 1995 foi realizada na Escola Secundária José Afonso.
Pela primeira vez foi assumida a designação de «Jogos de Reflexão» e a concretização ocorreu durante a semana, nas tardes de duas Quartas-feiras consecutivas. Estas duas novidades mantiveram-se nos interescolas seguintes.

As tardes escolhidas foram as dos dias 3 e 10 de Maio. E houve 11 escolas inscritas, com 44 equipas (8 do 2º Ciclo, 30 do 3º Ciclo e 6 do Secundário) para as modalidades de Abalone (8 equipas), Damas Clássicas (9), Othelo (3), Quatro em Linha (11) e Xadrez (13).
Das 11 escolas, nove (com 38 equipas) situavam-se nos concelhos de Almada e Seixal (usando os nomes em vigor na altura, elas foram as Escolas Básicas da Amora, de Corroios, da Cova da Piedade e de Vale de Milhaços e as Escolas Secundárias Anselmo de Andrade, António Gedeão, Emídio Navarro, José Afonso, Nº 1 de Corroios e Nº 1 e Nº 2 do Laranjeiro).
Das duas que vieram de fora, uma, com 4 equipas, uma foi a ES da Cidadela (Cascais) e outra, com 2 equipas, foi a EB de Azeitão.

No José Afonso foram utilizados os espaços da Ludoteca e do Ginásio Pequeno, dois locais muito próximos um do outro, ambos no Pavilhão D, o que facilitava a circulação dos alunos e dos professores.

Eis duas fotografias dos torneios, a primeira tirada no Ginásio Pequeno e a segundo na Ludoteca, estando a ser disputados, respectivamente, o Abalone e o Xadrez:




No exterior do pavilhão foi criado um espaço com jogos e quebra-cabeças destinados a quem apenas veio ver ou já terminara os seus jogos. Na fotografia seguinte são reconhecíveis, sobre as mesas, a Torre de Hanói, o Solitário, o Quatro em Linha e o Ouri:



Comentários

A preparação deste interescolas incluíu a elaboração de um «Regulamento», enviado para as escolas interessadas, onde, entre outras indicações, se limitava as inscrições a uma equipa, por ciclo e por modalidade, constituída por quatro alunos efectivos e um suplente.
Propunha-se nele, além das modalidades que se viriam a disputar, também o «Connections», que não teve inscritos.
E ainda se estipulava que as inscrições seriam pagas (500 escudos por equipa, para as lembranças e para os lanches).

Para as escolas inscritas, foi-lhes enviado este mapa (ainda não dispúnhamos do Google Maps …):


Os transportes ficaram a cargo de cada escola (foram utilizados carros, transportes públicos e, num caso, alugado um autocarro).
Os transportes eram um desafio logístico pesado para as escolas, pelo que, no fim deste interescolas, se colocou a hipótese de, no ano seguinte, se solicitar apoio aos respectivos municípios (estes já o prestavam para diversas outras actividades escolares).

A equipa coordenadora foi constituída por membros do Grupo Extracurricular do Núcleo da APM: o Fernando Camejo, a Lídia Matias, a Luísa Teixeira e o Pedro Esteves.
Apoiando localmente, estiveram o José Calado e o Manuel Neto.
As arbitragens ficaram a cargo dos professores Ana Mota, Fernando Camejo, Manuel Neto, Narciso e Pedro Esteves e do aluno Zenildo Cassoneca (do 9º G). Este andara durante os campeonatos internos a tentar perceber como se procedia à arbitragem e nas vésperas do interescolas pediu-me para se responsabilizar por uma, eu aceitei e ele saíu-se muito bem (creio que arbitrou as Damas).
Ainda houve outros apoios, nomeadamente o que foi solicitado aos professores das diversas escolas participantes, como o empréstimo de material de jogo e o preenchimento dos diplomas e das justificações de faltas (nalgumas escolas o interescolas disputou-se dentro do horário lectivo).
Também o Conselho Directivo da José Afonso deu um contributo especial, oferecendo metade dos lanches distribuídos aos participantes; e os alunos de Comunicação e de Arte & Design fizeram entrevistas, fotografaram e filmaram ...

As equipas vencedoras foram:
No 2 º Ciclo, a EB Amora (Abalone, Quatro em Linha e Xadrez), a EB Vale de Milhaços (Damas).
No 3º Ciclo, a ES Emídio Navarro (Xadrez), a ES José Afonso (Othelo) e a ES Nº 1 do Laranjeiro (Abalone).
Nos torneios que, por razões práticas, juntaram equipas do 3º Ciclo e Secundário, a ES da Cidadela (Damas) e a ES João de Barros (Quatro em Linha).
E no Secundário, a ES António Gedeão (Xadrez).
Ou seja, das 11 escolas inscritas, 8 obtiveram pelo menos um resultado «de topo» (tendo apenas uma delas, a EB da Amora, acumulado mais do que um desses resultados).

As equipas da ES José Afonso foram constituídas por:
Abalone (3ª classificada); João Calhegas, Nuno Costa, Peter Sousa, Ricardo Barros e Ricardo Costa.
Damas (3ª classificada): António Tavares, João Cabral, José Silvestre, Pedro Gonçalves e Peter Sousa.
Othelo (1ª classificada): Bruno Dias, Emanuel Pedrosa, João Calhegas e Peter Sousa.
Quatro em Linha (7ª classificada): Emanuel Pedrosa, Nuno Costa, Ricardo Barros e Wilson Santos.
Xadrez (2ª classificada): Anselmo Lourenço, António Tavares, Áureo Soares, Olavo Sousa e Rogério Silva.

O Boletim Municipal de Almada, o Boletim Municipal do Seixal e o jornal «Outra Banda» publicaram notícias sobre este interescolas.


Fontes: Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos ESJA Seis (Doc.s 65, 88, 89, 91, 94, 95, 96 e 97) / Album de fotografias analógicas ESJA Oito (três fotos em 3 de Maio de 1995)

[088] Em 1994-95 a José Afonso estava a mudar: o caso da elaboração do Projecto Educativo

Memórias

No texto que escrevi, algures no início de 1992-93, propondo à Escola Secundária do Seixal e ao seu Conselho Directivo que elaborássemos um Projecto Educativo [ver o testemunho «077»], incluí uma citação de Berta Macedo em que ela, após estudar empiricamente o que algumas escolas já haviam feito, o classificou, de acordo com a mobilização de actores, em três tipos:
* o projecto do «chefe» ou da «equipa», correspondente ao paradigma racional-burocrático de “organização eficaz”, no qual os factores como a negociação, a tomada de decisão e a participação não são considerados elementos fundamentais para a sua riqueza e realização;
* o projecto «adição de projectos dos grupos», correspondente a uma organização escolar descriptível como “sistema debilmente acoplado” ou como “anarquia organizada”;
* e o projecto da «organização escola», correspondente ao reconhecimento de que “é na riqueza dos actores e na sua interacção que se joga uma parte fundamental da coerência, pertinência e qualidade dos projectos”, sendo neste sentido que “elaborar um projecto de escola pode ser entendido como algo que ultrapassa a questão do domínio de um conjunto de técnicas e dispositivos sobre metodologias de projecto, para se transformar num processo de compromisso colectivo sobre a lógica ou lógicas de funcionamento da escola”.

Só em 1993-94 esta tentativa de elaborar um Projecto Educativo foi iniciada, tendo sido realizadas pelo menos três reuniões (as que tenho documentadas). As duas primeiras destinaram-se ao grupo que iniciaria o processo e a terceira foi aberta a toda a escola.
A abertura à escola pretendia mobilizar os professores mais dinâmicos, a partir dos quais outros poderiam ser depois mobilizados. Por isso ficou acordado que, ao longo do ano, esses professores iriam contactar os grupos que pensávamos vir a ter um papel na definição do projecto: a Associação de Estudantes, a Associação de Pais, os Funcionários, os grupos disciplinares, os projectos da escola, a Secção de Formação do Conselho Pedagógico, as turmas e os respectivos Directores de Turma).

Para ter uma primeira ideia sobre o resultado desta estratégia «bola de neve» é possível recorrer a uma lista de quem se envolveu (sempre voluntariamente) nestas reuniões:


O grupo inicial era constituído por dois membros de um antigo Conselho Directivo (o Louro e eu), por dois membros do Conselho Directivo em funções (o Luís Carlos e a Teresa) e pela coordenadora da Biblioteca Escolar (a Alice).
Quanto aos participantes na reunião aberta, com a excepção de dois, ou haviam sido membros de Conselhos Directivos, ou eram-no, ou viriam a sê-lo nos próximos anos. As excepções eram a Alice e a Carla.

Em 1994-95 o número de reuniões de que tenho notícia não foi muito maior (quatro) mas o número de participantes alargou-se bastante:



Comparando-os com o ano anterior, deixaram de participar nestas reuniões a Alice Santos, a Anabela Esteves, a Carla Ferreira, a Manuela Vieira e, por terem saído da escola (para a Câmara Municipal do Seixal), o Luís Carlos Carvalho e a Teresa Ré (penso que foi durante este ano que ela saiu).

No total dos dois primeiros anos, houve 35 professores que participaram em pelo menos uma das sete reuniões realizadas, tendo eu sido o único totalista, seguido pelo João Louro e pela Madalena Ferreira, que participaram em cinco (a Madalena apenas se iniciou no final de 1993-94).
Estes 35 participantes representariam perto de 20 % do total dos professores da escola, o que não seria mau, desde que eles se envolvessem com entusiasmo. Mas a média de reuniões em que cada um deles participou foi muito baixa (ligeiramente inferior a 2 reuniões). Pelo que, apesar de a média de participantes em cada uma das reuniões ter sido mais aceitável (cerca de 10), nem era de esperar um trabalho continuado por parte de muitos deles, nem uma grande interacção entre os diversos sectores da escola.
É possível ilustrar este receio com o caso dos professores que animavam os projectos extracurriculares: dos 20 que foram referenciados na reunião de 11 de Janeiro de 1995 [ver testemunho «086»], somente 10 participaram nos encontros destinados à elaboração do Projecto Educativo em 1993-94 e 1994-95 (e representavam apenas seis dos dez projectos animados por esses 20 professores).

Contrariando o desconforto que este receio justificava, houve progressos no trabalho efectuado durante 1994-95:
* as áreas a figurar no futuro Projecto Educativo começaram a estabilizar (a curricular; a extracurricular; a social; a administrativa; e a das instalações);
* foram constituídos grupos de trabalho para entre o fim das aulas e o início das férias dos professores: a Ana Chorincas, a Ana Fiel e a Rosário Leocádio elaborariam o «inquérito» a aplicar depois das férias; a Antónia Fradinho, a Aurora Garcia e eu pegávamos na «área escola»; a Adelaide Pereira, a Clorinda Agostinho, o João Louro e a Naia Tricamegy analisavam as «questões pedagógicas»; e a Alexandra Pratas, a Ana Crespo, a Madalena Ferreira, a Adelaide Duarte e a Luísa Gracioso dedicavam-se à «escola cultural».
* e foi elaborado um calendário para o que se previa ser necessário fazer no ano seguinte, 1995-96, que começaria por um plenário dos anteriores grupos de trabalho, a concretizar logo no início de Setembro, antes de as aulas recomeçarem.

E com estes progressos chegavam também os sinais da diversidade de pontos de vista que, oportunamente, teriam de ser conciliados:
* uns pensavam que o Projecto Educativo deveria «valorizar a cultura própria» da escola, sendo portanto necessário respondermos a perguntas como «em quê, como escola, somos bons?»;
* outros pensavam que, se o Projecto Educativo (por exemplo) optasse pelas «pedagogias activas», deveríamos, consequentemente, definir o «perfil do aluno» a sair da escola, bem como o «perfil do professor» necessário ao êxito desse trabalho;
* e havia quem pensasse ao contrário dos anteriores, defendendo que só através da concretização do Projecto Educativo se poderia conhecer a «cultura da escola», e até «criar uma nova cultura», pelo que o «perfil da escola dependia dos alunos e dos professores que nela estivessem».


Comentários

A classificação dos Projectos Educativos que a Berta Macedo elaborou era, como qualquer outra classificação, uma forma de estabelecer diferenças que ajudassem a perceber as forças e as fraquezas dos casos concretos.

Com base nessa classificação, que se pode então dizer do nosso primeiro Projecto Educativo, elaborado em função da candidatura à «Escola Cultural» e exclusivamente constituído com os contributos dos membros do Conselho Pedagógico [ver o testemunho «030»]?
Ele nem resultou de «um chefe», nem de «uma equipa», nem de «uma aproximação entre actores», sendo mais parecido com «uma adição de projectos». Mas essa «adição» não tinha qualquer «alma»: mal se soube que não havíamos sido seleccionados para a Escola Cultural, o projecto foi automaticamente esquecido. Elaborar este Projecto Educativo foi uma tentativa para aproveitar uma oportunidade, seguida por uma resposta oportunista.

A intenção subjacente à segunda tentativa para elaborar um Projecto Educativo, esta que estou a descrever, apontava, claramente, para o terceiro dos tipos descritos pela Berta Macedo, ou seja, pretendia que fosse um projecto resultante da aproximação e da interacção entre os diversos actores escolares e da sua consequente adopção por todos. Por isso estes foram desde cedo identificados e o processo de elaboração mantido aberto à participação de todos, procurando assim evitar quer a sua apropriação por grupos particulares, quer a mera adição dos contributos dos diversos membros da comunidade.
Esta segunda tentativa também viria a falhar. Distante da anterior em cerca de meia década, ela é uma boa fonte para perceber o que a escola evoluiu ao longo deste espaço de tempo e, também, por ter sido uma tentativa lenta, para perceber o que ainda lhe faltava evoluir para se poder reivindicar como «autónoma».


Fontes:
Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos ESJA Seis (Doc.s 65, 71, 87, 103, 106 e 107)
Artigo de Macedo (1994)