[090] O 5º Encontro Regional de Professores de Matemática

Memórias

Para o Núcleo Regional da APM, 1994-95 foi um ano discreto.
Segundo os meus documentos, foram prosseguidas apenas três das linhas de trabalho iniciadas em anos anteriores: o Grupo de Trabalho Extracurricular; o Interescolas de Jogos de Reflexão [ver o testemunho anterior]; e o Encontro Regional de Professores de Matemática.

Este ano, o Grupo de Trabalho Extracurricular envolveu docentes de 12 escolas dos concelhos de Almada e Seixal, voltando a adoptar a designação «MATlab». As reuniões foram sempre na Emídio Navarro (em 13 de Setembro, 26 de Novembro, 21 de Janeiro, 18 de Fevereiro, 25 de Março e 27 de Maio), sendo dedicadas a ampliar os temas abordados nos anos anteriores e a proceder ao respectivo aprofundamento teórico. Procurou-se alargar o número de professores envolvidos nas pesquisas e na coordenação e visou-se mais consistentemente estabelecer ligações entre os temas não curriculares e os temas currículos.
Foi um trabalho de auto-formação, e nenhum dos professores se preocupou com a sua «creditação», contrariamente ao que começava a ser uma obsessão para outros, após a imposição da obrigatoriedade a que a formação contínua fora sujeita.

A realização do 3º Interescolas de Jogos de Reflexão, organizado pelo Grupo de Trabalho [ver o testemunho anterior], mostrou que esta iniciativa estava a entrar maturidade.

E a realização do 5º Encontro Regional de Professores de Matemática, realizado nos dias 12, 13 e 14 de Julho, na Escola Preparatória de Corroios, mostrou que as iniciativas do Núcleo já eram maduras no que respeita aos docentes: ele juntou 90 professores de todos os graus de ensino, vindos de 31 escolas, tendo-se 15 desses professores responsabilizado pelas intervenções.

Nos encontros anteriores, o total dos professores participantes vindos de Escolas Básicas havia oscilado entre 5 e 9 (de apenas 3 a 5 escolas), tendo desta vez sido 33 professores (de 15 escolas). O número de Escolas Secundárias oscilou pouco ao longo destes encontros (entre 12 e 16, variando os respectivos professores entre 39 e 53). E o número de responsáveis pelas intervenções, apenas foi claramente superior no 1º Encontro Regional (21), tendo-se estabilizado nos seguintes (entre 12 e 16):

Houve uma razão para o excepcional número de professores do Ensino Básico que participaram neste encontro: a Ana Boavida, um dos membros da Comissão Coordenadora do Núcleo e, portanto, também organizadora do Encontro Regional, leccionava no Ensino Superior, pelo que tinha uma grande ligação aos professores que leccionavam no 1º Ciclo, pelo que terá mobilizado a sua participação.
Contrariamente aos encontros anteriores, não houve intervenções de professores envolvidos em novos projectos nas escolas, mas sim reflexões sobre o que se experimentara e aprendera em anos anteriores (2 sessões práticas); e aumentaram as intervenções baseadas na teoria (4 sessões práticas, maioritariamente orientadas por professores do ensino superior).
Uma das sessões práticas relacionadas com projectos foi orientada pela Ana Mota, pela Rita Vieira e por mim, resultado do que aprenderamos ao longo do ano no MATlab (designamo-la por “Explorações Matemáticas: Teorema de Pitágoras & Teorema das Quatro Cores”).
Além destas 6 sessões prática houve duas outras intervenções. Uma delas foi bastante estranha: o José Manuel Matos, que em encontros anteriores realizara interessantes intervenções com a Ana Boavida, decidiu desta vez apresentar, sozinho, uma descrição pormenorizada da «Educação Matemática», o novo campo de investigação que se estava a constituir em Portugal (e que noutros países já se tinha constituído há muito); talvez a sua ideia fosse promover o interesse de professores do Ensino Não Superior a inscreverem-se nos mestrados relacionados com este campo, em particular na Universidade Nova de Lisboa (eu e a Filomena Teles estávamos lá [ver testemunho «073»], tendo-o como nosso potencial orientador da tese); só que ele se esqueceu que a Educação Matemática não é só um «campo de investigação», mas sim a prática de qualquer professor envolvido no «ensino» da Matemática, e esse esquecimento pode ter ajudado a cavar um fosso entre estas duas formas de acção (os investigadores estavam a fechar-se na sua própria acção).
A outra intervenção foi uma mesa redonda dedicada a apreciar a reforma curricular cuja generalização estava em vias de ser concluída. Intitulada “Ensino da Matemática: Reflexões sobre o fim de um Ciclo”, foi moderada por mim e teve como convidados o Fernando Camejo, o Gastão Cristelo e a Patrícia Cascais, que comentaram uma série de questões que, previamente, foram solicitadas a quem as quisesse colocar. A introdução, tal como foi depois publicada nas actas do encontro, foi esta:



As questões chegadas à mesa, para serem comentadas pelos três convidados, foram divididas em três grupos. Parece-me interessante reler o que então se questionou e comentou, dado ser uma forma de conhecer as dinâmicas resultantes das reformas curriculares lançadas «de cima para baixo».

O primeiro grupo dizia respeito à gestão dos novos programas pelos professores e incluiu as seguintes questões:


Os comentários que os três convidados fizeram a estas questões foram estes:


O segundo grupo de questões incluía as referentes aos resultados do processo educativo durante esta reforma curricular:


Eis os comentários feitos:


E o terceiro grupo questionava o papel dos professores no processo da reforma curricular:


E a estas questões foram feitos estes comentários:



Comentários (a todo este testemunho)

Aos sinais de «mudança» que identifiquei na José Afonso [ver testemunhos «087» e «088»] não seriam alheios outros sinais de mudança de que me estava a aperceber no associativismo e, em geral, no sistema educativo. Este 5º Encontro Regional fundamenta bastante bem essa minha impressão, sendo identificáveis nele, como factores desequilibrantes, a «reforma curricular» e as pressões aos níveis da «formação contínua» e da «organização das escolas».

Como consequência, este conjunto de condições estava a estabelecer diversas divisões: os professores do ensino superior começavam a pensar que também deveriam «ensinar os professores do ensino não superior» (e não apenas os futuros professores); e os professores do ensino não superior começavam a dividir-se, uma minoria procurando manter a sua «autonomia» (iniciativas curriculares próprias; formação contínua independente) e a maioria hesitando acerca dos exemplos em que se deveria inspirar (os do Ministério da Educação, os do Ensino Superior, os dos seus colegas mais «autónomos»).

Para além destas divisões, era sobretudo claro que muitos professores não se sentiam confortáveis com a reforma curricular. E que esta, que ainda não terminara a sua generalização, já era sentida como tendo falhado.


Fontes: Pedro Esteves / Arquivadores de documentos analógicos ESJA Seis (Doc. 65) e Núcleo APM Um (Doc.s 54 e 55) / Actas do 5º Encontro Regional

[089] O 3º Interescolas de Jogos de Reflexão de Almada e Seixal

Memórias

Depois de ter sido realizado na Escola Secundária António Gedeão e na Escola Básica de Corroios, o interescolas de 1995 foi realizada na Escola Secundária José Afonso.
Pela primeira vez foi assumida a designação de «Jogos de Reflexão» e a concretização ocorreu durante a semana, nas tardes de duas Quartas-feiras consecutivas. Estas duas novidades mantiveram-se nos interescolas seguintes.

As tardes escolhidas foram as dos dias 3 e 10 de Maio. E houve 11 escolas inscritas, com 44 equipas (8 do 2º Ciclo, 30 do 3º Ciclo e 6 do Secundário) para as modalidades de Abalone (8 equipas), Damas Clássicas (9), Othelo (3), Quatro em Linha (11) e Xadrez (13).
Das 11 escolas, nove (com 38 equipas) situavam-se nos concelhos de Almada e Seixal (usando os nomes em vigor na altura, elas foram as Escolas Básicas da Amora, de Corroios, da Cova da Piedade e de Vale de Milhaços e as Escolas Secundárias Anselmo de Andrade, António Gedeão, Emídio Navarro, José Afonso, Nº 1 de Corroios e Nº 1 e Nº 2 do Laranjeiro).
Das duas que vieram de fora, uma, com 4 equipas, uma foi a ES da Cidadela (Cascais) e outra, com 2 equipas, foi a EB de Azeitão.

No José Afonso foram utilizados os espaços da Ludoteca e do Ginásio Pequeno, dois locais muito próximos um do outro, ambos no Pavilhão D, o que facilitava a circulação dos alunos e dos professores.

Eis duas fotografias dos torneios, a primeira tirada no Ginásio Pequeno e a segundo na Ludoteca, estando a ser disputados, respectivamente, o Abalone e o Xadrez:




No exterior do pavilhão foi criado um espaço com jogos e quebra-cabeças destinados a quem apenas veio ver ou já terminara os seus jogos. Na fotografia seguinte são reconhecíveis, sobre as mesas, a Torre de Hanói, o Solitário, o Quatro em Linha e o Ouri:



Comentários

A preparação deste interescolas incluíu a elaboração de um «Regulamento», enviado para as escolas interessadas, onde, entre outras indicações, se limitava as inscrições a uma equipa, por ciclo e por modalidade, constituída por quatro alunos efectivos e um suplente.
Propunha-se nele, além das modalidades que se viriam a disputar, também o «Connections», que não teve inscritos.
E ainda se estipulava que as inscrições seriam pagas (500 escudos por equipa, para as lembranças e para os lanches).

Para as escolas inscritas, foi-lhes enviado este mapa (ainda não dispúnhamos do Google Maps …):


Os transportes ficaram a cargo de cada escola (foram utilizados carros, transportes públicos e, num caso, alugado um autocarro).
Os transportes eram um desafio logístico pesado para as escolas, pelo que, no fim deste interescolas, se colocou a hipótese de, no ano seguinte, se solicitar apoio aos respectivos municípios (estes já o prestavam para diversas outras actividades escolares).

A equipa coordenadora foi constituída por membros do Grupo Extracurricular do Núcleo da APM: o Fernando Camejo, a Lídia Matias, a Luísa Teixeira e o Pedro Esteves.
Apoiando localmente, estiveram o José Calado e o Manuel Neto.
As arbitragens ficaram a cargo dos professores Ana Mota, Fernando Camejo, Manuel Neto, Narciso e Pedro Esteves e do aluno Zenildo Cassoneca (do 9º G). Este andara durante os campeonatos internos a tentar perceber como se procedia à arbitragem e nas vésperas do interescolas pediu-me para se responsabilizar por uma, eu aceitei e ele saíu-se muito bem (creio que arbitrou as Damas).
Ainda houve outros apoios, nomeadamente o que foi solicitado aos professores das diversas escolas participantes, como o empréstimo de material de jogo e o preenchimento dos diplomas e das justificações de faltas (nalgumas escolas o interescolas disputou-se dentro do horário lectivo).
Também o Conselho Directivo da José Afonso deu um contributo especial, oferecendo metade dos lanches distribuídos aos participantes; e os alunos de Comunicação e de Arte & Design fizeram entrevistas, fotografaram e filmaram ...

As equipas vencedoras foram:
No 2 º Ciclo, a EB Amora (Abalone, Quatro em Linha e Xadrez), a EB Vale de Milhaços (Damas).
No 3º Ciclo, a ES Emídio Navarro (Xadrez), a ES José Afonso (Othelo) e a ES Nº 1 do Laranjeiro (Abalone).
Nos torneios que, por razões práticas, juntaram equipas do 3º Ciclo e Secundário, a ES da Cidadela (Damas) e a ES João de Barros (Quatro em Linha).
E no Secundário, a ES António Gedeão (Xadrez).
Ou seja, das 11 escolas inscritas, 8 obtiveram pelo menos um resultado «de topo» (tendo apenas uma delas, a EB da Amora, acumulado mais do que um desses resultados).

As equipas da ES José Afonso foram constituídas por:
Abalone (3ª classificada); João Calhegas, Nuno Costa, Peter Sousa, Ricardo Barros e Ricardo Costa.
Damas (3ª classificada): António Tavares, João Cabral, José Silvestre, Pedro Gonçalves e Peter Sousa.
Othelo (1ª classificada): Bruno Dias, Emanuel Pedrosa, João Calhegas e Peter Sousa.
Quatro em Linha (7ª classificada): Emanuel Pedrosa, Nuno Costa, Ricardo Barros e Wilson Santos.
Xadrez (2ª classificada): Anselmo Lourenço, António Tavares, Áureo Soares, Olavo Sousa e Rogério Silva.

O Boletim Municipal de Almada, o Boletim Municipal do Seixal e o jornal «Outra Banda» publicaram notícias sobre este interescolas.


Fontes: Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos ESJA Seis (Doc.s 65, 88, 89, 91, 94, 95, 96 e 97) / Album de fotografias analógicas ESJA Oito (três fotos em 3 de Maio de 1995)

[088] Em 1994-95 a José Afonso estava a mudar: o caso da elaboração do Projecto Educativo

Memórias

No texto que escrevi, algures no início de 1992-93, propondo à Escola Secundária do Seixal e ao seu Conselho Directivo que elaborássemos um Projecto Educativo [ver o testemunho «077»], incluí uma citação de Berta Macedo em que ela, após estudar empiricamente o que algumas escolas já haviam feito, o classificou, de acordo com a mobilização de actores, em três tipos:
* o projecto do «chefe» ou da «equipa», correspondente ao paradigma racional-burocrático de “organização eficaz”, no qual os factores como a negociação, a tomada de decisão e a participação não são considerados elementos fundamentais para a sua riqueza e realização;
* o projecto «adição de projectos dos grupos», correspondente a uma organização escolar descriptível como “sistema debilmente acoplado” ou como “anarquia organizada”;
* e o projecto da «organização escola», correspondente ao reconhecimento de que “é na riqueza dos actores e na sua interacção que se joga uma parte fundamental da coerência, pertinência e qualidade dos projectos”, sendo neste sentido que “elaborar um projecto de escola pode ser entendido como algo que ultrapassa a questão do domínio de um conjunto de técnicas e dispositivos sobre metodologias de projecto, para se transformar num processo de compromisso colectivo sobre a lógica ou lógicas de funcionamento da escola”.

Só em 1993-94 esta tentativa de elaborar um Projecto Educativo foi iniciada, tendo sido realizadas pelo menos três reuniões (as que tenho documentadas). As duas primeiras destinaram-se ao grupo que iniciaria o processo e a terceira foi aberta a toda a escola.
A abertura à escola pretendia mobilizar os professores mais dinâmicos, a partir dos quais outros poderiam ser depois mobilizados. Por isso ficou acordado que, ao longo do ano, esses professores iriam contactar os grupos que pensávamos vir a ter um papel na definição do projecto: a Associação de Estudantes, a Associação de Pais, os Funcionários, os grupos disciplinares, os projectos da escola, a Secção de Formação do Conselho Pedagógico, as turmas e os respectivos Directores de Turma).

Para ter uma primeira ideia sobre o resultado desta estratégia «bola de neve» é possível recorrer a uma lista de quem se envolveu (sempre voluntariamente) nestas reuniões:


O grupo inicial era constituído por dois membros de um antigo Conselho Directivo (o Louro e eu), por dois membros do Conselho Directivo em funções (o Luís Carlos e a Teresa) e pela coordenadora da Biblioteca Escolar (a Alice).
Quanto aos participantes na reunião aberta, com a excepção de dois, ou haviam sido membros de Conselhos Directivos, ou eram-no, ou viriam a sê-lo nos próximos anos. As excepções eram a Alice e a Carla.

Em 1994-95 o número de reuniões de que tenho notícia não foi muito maior (quatro) mas o número de participantes alargou-se bastante:



Comparando-os com o ano anterior, deixaram de participar nestas reuniões a Alice Santos, a Anabela Esteves, a Carla Ferreira, a Manuela Vieira e, por terem saído da escola (para a Câmara Municipal do Seixal), o Luís Carlos Carvalho e a Teresa Ré (penso que foi durante este ano que ela saiu).

No total dos dois primeiros anos, houve 35 professores que participaram em pelo menos uma das sete reuniões realizadas, tendo eu sido o único totalista, seguido pelo João Louro e pela Madalena Ferreira, que participaram em cinco (a Madalena apenas se iniciou no final de 1993-94).
Estes 35 participantes representariam perto de 20 % do total dos professores da escola, o que não seria mau, desde que eles se envolvessem com entusiasmo. Mas a média de reuniões em que cada um deles participou foi muito baixa (ligeiramente inferior a 2 reuniões). Pelo que, apesar de a média de participantes em cada uma das reuniões ter sido mais aceitável (cerca de 10), nem era de esperar um trabalho continuado por parte de muitos deles, nem uma grande interacção entre os diversos sectores da escola.
É possível ilustrar este receio com o caso dos professores que animavam os projectos extracurriculares: dos 20 que foram referenciados na reunião de 11 de Janeiro de 1995 [ver testemunho «086»], somente 10 participaram nos encontros destinados à elaboração do Projecto Educativo em 1993-94 e 1994-95 (e representavam apenas seis dos dez projectos animados por esses 20 professores).

Contrariando o desconforto que este receio justificava, houve progressos no trabalho efectuado durante 1994-95:
* as áreas a figurar no futuro Projecto Educativo começaram a estabilizar (a curricular; a extracurricular; a social; a administrativa; e a das instalações);
* foram constituídos grupos de trabalho para entre o fim das aulas e o início das férias dos professores: a Ana Chorincas, a Ana Fiel e a Rosário Leocádio elaborariam o «inquérito» a aplicar depois das férias; a Antónia Fradinho, a Aurora Garcia e eu pegávamos na «área escola»; a Adelaide Pereira, a Clorinda Agostinho, o João Louro e a Naia Tricamegy analisavam as «questões pedagógicas»; e a Alexandra Pratas, a Ana Crespo, a Madalena Ferreira, a Adelaide Duarte e a Luísa Gracioso dedicavam-se à «escola cultural».
* e foi elaborado um calendário para o que se previa ser necessário fazer no ano seguinte, 1995-96, que começaria por um plenário dos anteriores grupos de trabalho, a concretizar logo no início de Setembro, antes de as aulas recomeçarem.

E com estes progressos chegavam também os sinais da diversidade de pontos de vista que, oportunamente, teriam de ser conciliados:
* uns pensavam que o Projecto Educativo deveria «valorizar a cultura própria» da escola, sendo portanto necessário respondermos a perguntas como «em quê, como escola, somos bons?»;
* outros pensavam que, se o Projecto Educativo (por exemplo) optasse pelas «pedagogias activas», deveríamos, consequentemente, definir o «perfil do aluno» a sair da escola, bem como o «perfil do professor» necessário ao êxito desse trabalho;
* e havia quem pensasse ao contrário dos anteriores, defendendo que só através da concretização do Projecto Educativo se poderia conhecer a «cultura da escola», e até «criar uma nova cultura», pelo que o «perfil da escola dependia dos alunos e dos professores que nela estivessem».


Comentários

A classificação dos Projectos Educativos que a Berta Macedo elaborou era, como qualquer outra classificação, uma forma de estabelecer diferenças que ajudassem a perceber as forças e as fraquezas dos casos concretos.

Com base nessa classificação, que se pode então dizer do nosso primeiro Projecto Educativo, elaborado em função da candidatura à «Escola Cultural» e exclusivamente constituído com os contributos dos membros do Conselho Pedagógico [ver o testemunho «030»]?
Ele nem resultou de «um chefe», nem de «uma equipa», nem de «uma aproximação entre actores», sendo mais parecido com «uma adição de projectos». Mas essa «adição» não tinha qualquer «alma»: mal se soube que não havíamos sido seleccionados para a Escola Cultural, o projecto foi automaticamente esquecido. Elaborar este Projecto Educativo foi uma tentativa para aproveitar uma oportunidade, seguida por uma resposta oportunista.

A intenção subjacente à segunda tentativa para elaborar um Projecto Educativo, esta que estou a descrever, apontava, claramente, para o terceiro dos tipos descritos pela Berta Macedo, ou seja, pretendia que fosse um projecto resultante da aproximação e da interacção entre os diversos actores escolares e da sua consequente adopção por todos. Por isso estes foram desde cedo identificados e o processo de elaboração mantido aberto à participação de todos, procurando assim evitar quer a sua apropriação por grupos particulares, quer a mera adição dos contributos dos diversos membros da comunidade.
Esta segunda tentativa também viria a falhar. Distante da anterior em cerca de meia década, ela é uma boa fonte para perceber o que a escola evoluiu ao longo deste espaço de tempo e, também, por ter sido uma tentativa lenta, para perceber o que ainda lhe faltava evoluir para se poder reivindicar como «autónoma».


Fontes:
Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos ESJA Seis (Doc.s 65, 71, 87, 103, 106 e 107)
Artigo de Macedo (1994)

[087] E no entanto, em 1994-95, a José Afonso estava a mudar: o caso dos contactos com entidades externas

Memórias


Em meados da década de 90 os contactos com entidades exteriores não eram uma novidade para a José Afonso, mas foi por essa altura que eles começaram a deixar de ser discretos.

Durante o ano lectivo de 1994-95 aconteceu um desses contactos que, tanto quanto me recordo, não se voltou a repetir em anos posteriores: a AERSET (Associação das Empresas da Região de Setúbal) decidiu realizar, de 7 a 12 de Março, em Brejos de Azeitão, o que então designou por Feira da Formação 95.
As escolas do distrito de Setúbal foram desafiadas a participar, com os seus projectos, e, entre muitas outras, também a José Afonso lá dispôs de um espaço próprio, animado durante todas as tardes e noites da feira por grupos de alunos e de professores.
Nessa animação esteve incluída a Ludoteca, que disponibilizou diversos jogos e quebra-cabeças, tendo o «Ouri» tido um sucesso muito particular. A coordenação coube ao José Calado, na 3ª e na 4ª feira, ao Manuel Neto, na 5ª e na 6ª feira, e a mim, no fim-de-semana, com a ajuda de cerca de 30 alunos das minhas turmas.
Segundo me disseram o Calado e o Neto, os visitantes durante a semana foram, sobretudo, alunos de diversas escolas. E, de acordo com o que eu observei no fim-de-semana, foram maioritariamente os adultos a aparecer, embora passassem, olhassem mas raramente perguntassem e ainda menos experimentassem o que tinha vindo para a feira com a intenção de ser experimentado.
Na opinião de nós três, o que terá sido mais interessante na participação das escolas foi o intercâmbio de ideias entre os professores e os alunos das várias escolas envolvidas: quem expôs foi quem teve maior curiosidade acerca do que os outros expuseram.

Uma das alunas animadores do cantinho da Ludoteca, a Eurídice Pico, ao terminar a sua participação, comunicou deste modo a sua satisfação: “Nunca me diverti tanto na minha vida!

O cantinho da Física-Química da «José Afonso»

O Vítor Campos a supervisionar (rodeado pelas «máscaras»)

O cantinho da Mecanotecnia da «José Afonso»

O cantinho da Ludoteca da «José Afonso», com a Luísa Gracioso, os seus filhos e alguns alunos 



Comentários

A intuição de que aqueles que expuseram em Azeitão foram aqueles que também estiveram interessados em ver o que outros expuseram é radicalmente contrária à intenção subjacente à realização desta «Feira da Formação»: exibir ao público um suposto poder empresarial de mobilização.
Em minha opinião, o importante de qualquer feira é o contacto entre quem está pessoalmente e/ou profissionalmente envolvido no respectivo tema, pelo que é adequado perguntar se terá sido boa ideia as escolas terem aceite participar naquela feira, em vez de, organizando-se a si próprias, realizar uma feira destinada exclusivamente ao contacto entre alunos e professores em torno dos seus projectos, essa, sim, uma boa estratégia de «formação». Esta pergunta surgiu-me hoje, mas não me ocorreu na altura. E, como se verá abaixo (neste e noutros testemunhos), a alienação do controlo sobre as suas próprias iniciativas foi um problema que as escolas não identificaram a tempo de evitarem o seu enorme agravamento nas últimas três décadas.
Uma hipótese que coloco hoje é a de a identificação desse problema ter sido impossibilitada pela débil vontade de autonomia da esmagadora maioria dos professores.

Complementarmente à anterior, outra hipótese explicativa para que as escolas tenham começado a perder o controlo sobre as suas próprias iniciativas foi a vontade que muitas das entidades exteriores tiveram de serem elas a hegemonizar vastas áreas relacionadas com a educação e com as escolas. Dou a seguir alguns exemplos, que observei e anotei em 1994-96 (e que, nalguns casos, tinham raízes em anos anteriores), todos provenientes de entidades externas às escolas que dispunham de meios poderosos:
A Câmara Municipal do Seixal foi a primeira a concluir a Carta Escolar do concelho; para o fazer, inquiriu cuidadosamente os diversos actores educativos, entre eles as escolas; tratava-se, segundo o município, de um documento de “planeamento da rede escolar”, pelo que, penso, se justificava envolver os actores a quem foram solicitadas informações de “diagnóstico” na definição do que se pretendia para os próximos 10 anos (o horizonte do planeamento), desafio que não lhes foi feito. O município preferiu decidir sozinho.
A Câmara do Seixal também decidiu apoiar projectos das escolas, tendo estabelecido, unilateralmente, os temas que esses projectos poderiam ter para serem apoiados e o número de projectos a apoiar em cada escola;. Deste modo, introduziu uma distorção nas possibilidades de sobrevivência das diferentes iniciativas dos alunos e dos professores.
O Instituto de Apoio à Criança (IAC), ligado à Fundação Gulbenkian, concretizou em 1994 o 6º encontro sobre ludotecas (fazia-o de 2 em 2 anos). No Nùcleo Regional da APM (Associação de Professores de Matemática) desconhecíamos essa iniciativa, ficando a saber dela porque o IAC me contactou para conversarmos (o que aconteceu no dia 12 de Janeiro de 1994); informei o IAC sobre a Ludoteca da José Afonso, sobre as de Almada e Seixal e sobre as demais que conhecia, ligadas à APM e dispersas pelo País; e fiquei a saber que as ludotecas escolares conhecidas pelo IAC tinham um perfil de actividades diferente do reflexivo, sendo, maioritariamente, animadas por professores de línguas e de Educação Visual. Apesar desta franca troca de informações, nunca fomos convidados a participar nos encontros das ludotecas (mas também nunca fomos capazes de organizar um encontro nosso abrangendo ludotecas para além da nossa região).
Em 1994-95, o Projecto Viva a Escola (parte do Projecto Vida) teve o seu 5º ano de implementação. Segundo me pareceu pelos documentos que me chegaram, o seu tema central era, agora, o Programa de Promoção e Educação para a Saúde. Cada escola envolvida recebia anualmente 500 contos (muito mais do que cada escola envolvida nos projectos AlterMATivas e MATlab recebera do Instituto de Inovação Educacional) e os professores coordenadores dispunham de 4 horas semanais de redução de serviço lectivo, podendo candidatar-se à formação contínua na modalidade de projecto (nada de que qualquer dos professores envolvidos no AlterMATivas e no MATlab tivesse auferido). Não haveria, também aqui, uma distorção das condições necessárias à sobrevivência da diversidade de projectos das escolas?


Fontes: Pedro Esteves / Arquivador de documentos analógicos ESJA Seis (Doc.s 65, 78, 84, 85 e 86) / Álbuns de fotografias analógicas ESJA Sete (F114: 8, 12, 22 e 23) e Oito (F115: 4 e 12)